Processo número 1022415-34.2019
3ª. Vara do Juizado Especial da Fazenda Pública
Comarca da Capital
Vistos.
A pessoa jurídica constituída sob a forma de microempresa, (…), em litisconsórcio com (…), qualificados a folha 1, ajuizaram contra a JUNTA COMERCIAL DO ESTADO DE SÃO PAULO esta ação com o objetivo de que a ré seja obrigada a proceder à invalidação de um registro de ato de comércio envolvendo a primeira autora, seja quanto à transferência de titularidade, seja quanto ao tipo de atividade comercial realizada, e que a ré seja ainda condenada a reparar os danos causados com o indevido registro que levou a cabo.
Citada, a ré contestou, arguindo a sua ilegitimidade sob o argumento de que lhe cabe proceder apenas ao exame formal dos documentos que lhe são apresentados para registro, e que assim procedeu, de modo que, em havendo suposta ilegalidade quanto ao conteúdo dos documentos, não lhe cabe responder pelo ilícito, devendo os autores acionarem a pessoa que apresentou os documentos a registro.
Nesse contexto, FUNDAMENTO e DECIDO.
Há dois óbices à utilização deste sistema processual.
O primeiro radica na relação jurídico-material que, em se tendo tornado complexa no plano fático, em um grau considerável, há a necessidade da produção de prova pericial por uma modalidade que não pode ser circunscrever a um mero exame técnico. Com efeito, será necessário apurar se o conteúdo do ato levado a registro, e efetivamente registrado, ou seja, a transferência da titularidade da primeira autora e também o ramo comercial a que se dedica, se esse conteúdo é ou não correspondente à realidade, de modo que não se trata da alegação de falsidade documental, mas da falsidade do conteúdo do documento levado a registro. Para isso, será necessário apurar, por meio da análise dos documentos levados a registro quanto a seu conteúdo e a relação que mantém ou deveria manter com a realidade subjacente, com o exame dos livros fiscais, do que formou a vontade firmada no ato que transferiu a propriedade, e também quanto a se saber com segurança se houve ou não mudança de ramo comercial. Pelo que se vê, são muitas as questões controvertidas no plano fático, de modo que este sistema processual não é azado ao desimplicar da demanda.
Há ainda um outro importante óbice e que diz respeito à formação do polo passivo. Com efeito, um terceiro, cujo nome aparece na demanda, apresentou-se na Junta Comercial do Estado de São Paulo de posse de determinados documentos e requereu seu registro comercial, declarando a autenticidade deles, autenticidade que, sob o aspecto formal, foi aferida pela ré e legitimidade. Daí que esse terceiro poderá ter a sua esfera jurídica atingida pelo que vier a se decidir nos limites desta demanda. Ocorre, entretanto, que no sistema processual instituído pela lei federal 12.153/2009 a pessoa física não possui legitimidade para ser parte passiva, e, portanto, se não pode ser parte, não pode ser litisconsorte. E o litisconsórcio neste caso é o passivo necessário.
Destarte, os autores devem se utilizar de um sistema processual que lhes garanta o direito a um processo justo, ou seja, um sistema processual cujo campo probatório permita a produção de todas as provas que sejam necessárias ao desimplicar da demanda, e ainda um sistema processual que admita o litisconsórcio passivo necessário com pessoa física.
Este sistema processual, portanto, é inadequado ao exame do mérito da pretensão, pelos óbices apontados.
POSTO ISSO, por inadequação de sistema processual, declaro a extinção deste processo, sem resolução do mérito, nos termos do artigo 485, inciso VI, do Código de Processo Civil.
Quanto a encargos de sucumbência, prevalece a regra do artigo 55 da Lei federal de número 9.099, de modo que, em não se tendo caracterizado a prática pelos autores de ato que configure a litigância de má-fé, não se lhes pode impor o pagamento de qualquer encargo dessa natureza, sequer honorários de advogado.
Publique-se, registre-se e sejam as partes intimadas desta Sentença.
São Paulo, em 3 de agosto de 2020.
VALENTINO APARECIDO DE ANDRADE
JUIZ DE DIREITO