Vistos.
Sustenta a autora, (…) qualificada a folha 1, fazer jus ao serviço de transporte denominado “Atende”, que é prestado pela ré, SÃO PAULO TRANSPORTE SOCIEDADE ANÔNIMA, que é uma sociedade de economia mista sob controle acionário da Prefeitura de São Paulo, contra a qual a autora também litiga nesta demanda.
Citadas, as rés contestaram: a MUNICIPALIDADE DE SÃO PAULO para arguir a sua ilegitimidade, enquanto a SÃO PAULO TRANSPORTE SOCIEDADE ANÔNIMA, para invocar a Legislação que regula o serviço em questão e que fixa os requisitos, que não estão cumpridos no caso da autora.
Nesse contexto, FUNDAMENTO e DECIDO.
Configura-se a ilegitimidade da ré, MUNICIPALIDADE DE SÃO PAULO, porque a relação jurídico-material que forma o objeto desta ação não lhe diz respeito, senão que à sociedade de economia mista, SÃO PAULO TRANSPORTE SOCIEDADE ANÔNIMA, que, possuindo personalidade jurídica e judiciária própria, está a compor o polo passivo desta demanda.
A propósito, embora a Lei federal de número 12.153/2009, ao tratar da legitimidade para a causa (passiva), tenha excluído a sociedade de economia mista, isso somente se aplica às pessoas jurídicas de direito privado, porque em se tratando de uma entidade paraestatal, como sucede com a SÃO PAULO TRANSPORTE, ainda que constituída sob a forma de sociedade anônima, não há dúvida de que é de natureza pública o serviço que presta, de modo que a relação jurídico-material objeto da lide guarda essa mesma característica (a dizer: trata-se de uma relação jurídico-material de direito público), o que permite ampliar, por meio de uma interpretação extensiva, o rol do artigo 5º. inciso II, da Lei federal de número 12.153/2009, para alcançar a sociedade de economia mista, quando se cuida de uma entidade paraestatal e o ato que tenha praticado configure-se como um ato de império, e não de gestão.
Quanto ao mérito da pretensão.
O Decreto – SP de número 36.071/1996 institui o serviço de atendimento especial, denominado “Atende”, pelo qual o Poder Público municipal, por meio de uma entidade paraestatal, presta o serviço de transporte gratuito às pessoas portadoras de deficiência motora, mental e múltipla, temporária ou permanente, em alto grau de dependência.
Na esfera administrativa, a autora havia solicitado o fornecimento do serviço e o teve ali negado porque, segundo a ré, a autora não apresenta um quadro de deficiência motora “em alto grau de dependência”. De modo que a controvérsia, nesta lide, diz respeito à validez desse ato administrativo.
O intérprete deve, por óbvio, ater-se, sempre que possível, ao texto da norma, tal como fixado pelo legislador, buscando extrair seu conteúdo e alcance. De modo se o legislador exigiu que exista um “alto grau de dependência”, como consta expressamente da norma em questão, deve o intérprete considerar a finalidade dessa norma, que não foi a de dificultar o acesso ao serviço de transporte, mas o de validamente estabelecer as condições em que ele possa ser concedido.
A proteção ao deficiente físico é conferida por norma constitucional, mas não em termos absolutos, como, aliás, sucede com qualquer outro direito fundamental que a Constituição de 1988 tenha instituído. Daí a necessidade de se considerar sempre as circunstâncias do caso em concreto, examinando-se em seu contexto a posição jurídica do ente público, como deve ocorrer neste caso, em que se revela justificada a negativa da ré, por não se caracterizar uma deficiência motora da autora em grau acentuado, conforme exige a norma de regulação do serviço.
Poder-se-ia cogitar da pertinência de se produzir prova pericial quanto às condições motoras da autora, para que se pudesse melhor delinear em que grau ela se encontra. Mas o sistema processual fixado pela Lei federal de número 12.153/2009 não permite que esse tipo de perícia pudesse aqui ser produzida. Esse aspecto é de relevo assinalar, para que se o observe em termos de coisa julgada material.
POSTO ISSO, JULGO IMPROCEDENTE o pedido, declarando a extinção deste processo, com resolução, nos termos do artigo 485, inciso I, do Código de Processo Civil.
Quanto a encargos de sucumbência, prevalece a regra do artigo 55 da Lei federal de número 9.099, de modo que, em não se tendo caracterizado a prática pela autora de ato de litigância de má-fé, não se lhe pode impor o pagamento de qualquer encargo dessa natureza, sequer honorários de advogado. Gratuidade concedida à autora.
Publique-se, registre-se e sejam as partes intimadas desta Sentença; a DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO, pessoalmente.
São Paulo, em 30 de maio de 2019.
VALENTINO APARECIDO DE ANDRADE
JUIZ DE DIREITO