BALAS DE BORRACHA/PROTESTOS – DIREITO À LIVRE MANIFESTAÇÃO

Processo número 1016019-17.2014

Juízo de Direito da 10ª Vara da Fazenda Pública

Comarca da Capital

Vistos.

Discute-se nesta ação civil pública, ajuizada pela DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO, acerca do conteúdo e alcance de três direitos fundamentais previstos em nossa Constituição da República de 1988: o direito de reunião, previsto no artigo 5º., inciso XVI; o direito de liberdade de expressão, previsto no inciso IV do mesmo artigo 5º.; e o direito à cidade, previsto no artigo 182, “caput”, da Constituição – direitos fundamentais que, segundo afirma a autora, estão colocados em uma situação de injustificada desproteção jurídica em razão de medidas desproporcionais adotadas pela Polícia Militar do Estado de São Paulo, buscando, pois, a concessão de provimento jurisdicional que garanta o exercício desses direitos constitucionalmente reconhecidos.

Invocando a legitimidade que lhe é conferida pela Lei federal de número 7.347/1985 e Lei complementar de caráter nacional de número 80/1994 para a propositura de ação judicial na qual se pugne pela tutela de qualquer interesse difuso ou coletivo, e sustentando que em nosso Ordenamento Jurídico em vigor os direitos de reunião, de liberdade de expressão e o de “ à cidade” são direitos fundamentais reconhecidos e que devem ser garantidos através de um processo adequado e efetivo, afirma a autora que a ré, FAZENDA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO, por sua Polícia Militar, está a impedir o regular exercício desses direitos fundamentais, quando adota procedimento desproporcional, atuando com excessiva e desnecessária violência, seja no realizar abordagens sem o uso de qualquer técnica recomendável, seja também no empregar instrumentos inadequados às circunstâncias (balas de borracha, gás lacrimogênio e armas de grosso calibre à mostra), tudo com o claro objetivo, assevera a autora, de impedir o exercício dos mencionados direitos fundamentais, a ponto de aniquilar o uso desses direitos, como quer comprovar pelos diversos episódios que menciona em sua peça inicial, sustentando, pois, que as medidas de polícia adotadas pela ré devem ser caracterizadas como ilegítimas, porque desnecessárias e desproporcionais, pretendendo, nesse contexto, que a tutela jurisdicional comine à ré as providências que enumerou as folhas 91/95, dentre as quais a de obrigá-la a apresentar um projeto de atuação de sua Polícia Militar que defina parâmetros técnicos que garantam um efetivo exercício dos direitos de reunião e de livre manifestação, e que os policiais possam ser identificados facilmente e não usem armas de fogo, armas com balas de borracha e gás lacrimogênio, e que em razão da conduta desproporcional adotada nos eventos referidos, seja a ré condenada a reparar dano moral coletivo, na ordem de R$1.000.000,00 (um milhão de reais), por evento, em um total de oito eventos, cujo montante deverá ser revertido a um fundo específico, e igualmente condenada a reparar todo dano individual que tiver causado.

A peça inicial, aditada as folhas 527/531, está instruída com a documentação de folhas 140/522.

Cumprindo-se dispositivo legal, garantiu-se à ré o direito a manifestar-se previamente acerca da medida liminar pleiteada pela autora (folha 544). Manifestação prévia apresentada as folhas 548/562.

Intervenção do MINISTÉRIO PÚBLICO, a princípio por sua Promotoria do Patrimônio Público e Social, as folhas 536/541 e 1362/1372, opinando por se reconhecer a carência da ação e, subsidiariamente, pela não concessão da medida liminar.

As folhas 566/620, requerimento da associação denominada CONECTAS DIREITOS HUMANOS a que seja admitida a intervenção como “amicus curiae”. Intervenção admitida a esse título, conforme Decisão as folhas 1232/1233.

Decisão proferida as folhas 1232/1248, concedendo, parcialmente, a medida liminar. Registre-se a interposição de agravo de instrumento pela ré, ao qual o egrégio Tribunal de Justiça concedeu, em 5 de novembro de 2014, efeito suspensivo (v. Acórdão as folhas 1264/1266) – recurso ainda não julgado.

Citada, a ré contestou, arguindo, como matéria preliminar, a continência com ação na qual se pleiteia estabelecer restrições à conduta policial em protestos, ação em trâmite pela 14ª. Vara da Fazenda Pública desta Capital, a incompetência absoluta desta Vara de Fazenda Pública para cuidar de matéria circunscrita à competência da Justiça criminal, e a ilegitimidade ativa e a ausência do interesse processual, aduzindo quanto ao mérito da pretensão que os direitos fundamentais que a autora invoca não são absolutos e que devem ser harmonizados em face de outros direitos com os quais estejam a colidir, e que a Polícia Militar tem atuado segundo padrões e regras, com o objetivo de garantir que os protestos, quaisquer que sejam suas reivindicações, ocorram em forma pacífica, intervindo apenas quando se revelam violentos e criminosos, quando então a Polícia Militar age com a força necessária e adequada às circunstâncias do episódio, não cabendo ao Poder Judiciário modificar tais padrões técnicos de atuação da Polícia Militar (folhas 1127/1159).

Réplica as folhas 1277/1306.

As folhas 1313/1357 e 1398/1403, requerimento da associação ARTIGO 19 BRASIL, requerendo seja admitida sua intervenção como “amicus curiae”.

Em razão de r. Decisão emanada da Procuradoria Geral de Justiça do Estado de São Paulo em conflito de atribuições, no qual definiu que a Promotoria a oficiar neste processo é a Promotoria de Direitos Humanos (folhas 1448/1456, manifestou-se o MINISTÉRIO PÚBLICO por essa Promotoria as folhas 1405/1447, pela procedência do pedido.

É o RELATÓRIO.

FUNDAMENTO e DECIDO.

Versa esta ação civil pública sobre o conteúdo essencial de três direitos fundamentais (direito de reunião, direito de livre manifestação e o direito à cidade), constitucionalmente previstos em nosso Ordenamento Jurídico em vigor, direitos que estão em relação direta com bens jurídicos-constitucionais invocados pela ré, FAZENDA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO, instalando-se assim uma colisão concreta entre esses direitos fundamentais e bens jurídicos estatais, cuja análise passa necessariamente pela aplicação do princípio constitucional da proporcionalidade e suas formas de controle. Como afirma o conhecido publicista alemão, PETER HÄBERLE, a resposta à questão sobre o conteúdo essencial dos direitos fundamentais exige uma determinação do sentido desses mesmos direitos no conjunto da Constituição, a dizer, a análise da função desses direitos no contexto de uma aplicação prática das normas constitucionais, fazendo-se por isso necessário considerar as relações que os direitos fundamentais mantenham com bens jurídico-constitucionais (cf. “La Garantía del Contenido Esencial de los Derechos Fundamentales”, p. 7, tradução por Joaquín Brage Camazano, editorial Dykinson, Madrid, 2003).

Ação civil pública ajuizada pela DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO, cuja legitimidade foi reconhecida na Decisão proferida as folhas 1232/1247, a cujas razões reporto-me, embora seja necessário ressaltar que com a criação das Defensorias Públicas, o Ministério Público não é mais a única Instituição com legitimidade para a propositura de ações judiciais de proteção a interesses difusos e coletivos. Esse é importante papel é hoje compartilhado com as Defensorias Públicas, o que, de resto, é tanto melhor ao regime democrático por ser obviamente mais conveniente ao interesse público que o direito de ação não fique nas mãos de uma só instituição, que por algum motivo poderá deixar de fazer o que a Lei lhe determina (a proteção ao interesse público).

Ação civil pública que é azado remédio processual ao exame de pretensões fundadas em direitos fundamentais de matriz democrática, como são os direitos de reunião e de livre manifestação. E ainda quanto à adequação desse tipo de ação, é de rigor observar-se o que constitui a relação jurídico-material, porque esse elemento, extraído do direito material é, segundo uma consistente teoria processual, o que permite não apenas identificar a legitimidade, mas também o interesse de agir, nomeadamente quanto à adequação instrumental. Nesta ação civil pública, com efeito, coloca-se sob análise do Poder Judiciário um conflito entre direitos fundamentais relacionados à liberdade de reunião e de manifestação e bens jurídicos que o Estado invoca, no sentido de se lhe reconhecer o direito a que sua Polícia Militar atue segundo a forma e procedimento que vem adotando, quando emprega armas de fogo, balas de borracha e gás lacrimogênio para conter e dispersar pessoas que, em protestos, estiveram a agir com violência. Sustenta a ré, pois, que ao Poder Judiciário não cabe interferir sobre um assunto que é de natureza exclusivamente técnica, como é o que diz respeito a padrões de atuação da Polícia Militar, e em razão disso faleceria interesse de agir à autora, porque a ação civil pública não pode ser utilizada para discutir uma matéria em que o poder discricionário da Administração deve ficar livre de interferência judicial, conforme exige o princípio da separação de poderes.

Analisemos essa alegação, observando que o princípio da legalidade administrativa fez surgir o princípio da separação de poderes, criado, contudo, não com o propósito de alcançar uma perfeita organização estrutural para o exercício da soberania, como esclarece o administrativista português, Sérvulo Correia, mas sim “com o fito de criar condições institucionais de respeito da esfera individual” (“Legalidade e Autonomia Contratual nos Contratos Administrativos”, p. 25, Almedina editora, Coimbra, 2013). A ideia de fixar como princípio jurídico o da separação de poderes teve origem em Kant, que em diversos escritos enfatizou que a participação do povo no exercício da função legislativa (o que constitui a essência do princípio da legalidade) formava uma necessária garantia de proteção à liberdade do indivíduo, e essa garantia radicava em um sistema de separação de poderes, ideia depois também defendida por Montesquieu, para quem a separação de poderes não buscava distinguir objetivamente as funções estatais, mas sim a liberdade dos cidadãos (cf. Sérvulo Correia, obra mencionada, nota 32, p. 25 e 26). Assim, se durante muito tempo a doutrina do direito administrativo afirmou que em face dos atos discricionários o Poder Judiciário não podia e não devia intervir, porque o princípio da separação de poderes isso impedia, hoje essa teoria não mais subsiste, porque se passou a compreender que os atos discricionários podem afetar os direitos fundamentais e quando afetam, exigem uma atuação do Poder Judiciário que garanta uma eficaz proteção à esfera jurídica do indivíduo, com o exame da necessidade, oportunidade e aptidão da medida estatal, e com a ponderação dos custos por ela gerados. Daí ter a doutrina do direito administrativo reelaborado o estudo dos atos discricionários à luz dos direitos fundamentais, fixando a regra-motriz de que quanto maior a importância do direito fundamental contrastado por uma medida estatal, menor deve ser a margem de discricionariedade que se deve conceder à Administração – e maior o campo de atuação jurisdicional.

Defender-se, pois, a tese de que a área da segurança pública é uma área exclusivamente técnica e que por isso deve estar colocada sob um âmbito de “imunidade jurisdicional”, é, portanto, colocar abaixo todo um regime de proteção aos direitos fundamentais que, com esforço e sacrifício de várias vidas humanas, construiu-se histórica e lentamente, mas que hoje não mais admite retrocessos, sobretudo se considerarmos o regime jurídico de proteção jurisdicional que nos foi dado pela Constituição da República de 1988, dotado de princípios e regras que garantem o direito de ação e o devido processo legal em suas acepções processual e substancial, sendo que nesta última está abarcada a aplicação do princípio da proporcionalidade.

E como cuidou adscrever o MINISTÉRIO PÚBLICO, a demonstrar que o tema dos limites da atuação estatal em face dos direitos de reunião e de manifestação é daqueles em que o controle jurisdicional deve marcar presença, há projetos de lei no Congresso Nacional e na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo que regulam a matéria, sendo de se anotar que essa Assembleia Legislativa aprovou, por unanimidade, o projeto de lei de número 608/2013, proibindo o uso da bala de borracha pela Polícia Militar, projeto de lei que foi vetado pelo senhor Governador do Estado. Se fosse essa uma matéria que escapasse ao controle jurisdicional, e projetos de lei dessa natureza não estariam em trâmite, ou mais, não teriam sido aprovados pelo Parlamento, porque não teriam certamente sido aprovados em suas comissões de justiça. Atingindo, como atinge, direitos fundamentais, a atuação policial está, sim, submetida a controle jurisdicional.

Vale registrar, outrossim, o importante papel que o Tribunal Europeu de Direitos Humanos – TEDH vem desempenhando na Europa, quando corretamente pondera os direitos em conflito, prestigiando, sempre que possível, o direito fundamental de liberdade de expressão quando em confronto com outros direitos, alinhado que está esse Tribunal com o que a doutrina constitucional, sobretudo a alemã e portuguesa, vem escrevendo a respeito da proteção aos direitos e liberdades fundamentais. É chegada a hora, pois, de a Justiça brasileira engajar-se em uma proteção efetiva aos direitos fundamentais, como, aliás, já vem fazendo em uma área tão técnica quanto é a da segurança pública.

Estamos falando da área da saúde pública, na qual o Poder Judiciário brasileiro nunca viu nenhum obstáculo a intervir, embora reconhecesse que estivesse sempre a atuar em face de critérios técnicos acerca da dispensação de remédios e tratamentos. Registre-se, porque oportuno, que o egrégio Supremo Tribunal Federal está na iminência de julgar uma ação direta de constitucionalidade na qual se definirão critérios para o acesso a medicamentos, e ninguém terá argumentado, não ao menos com um mínimo de razão, que o princípio da separação de poderes impedisse o nosso maior Tribunal de examinar essa matéria. Aliás, em uma sociedade cada vez mais complexa, a atuação do Poder Judiciário tem se tornado cada vez mais abrangente (o número de processos judiciais confirma essa afirmação), e o grau de civilização de um país depende diretamente não apenas da possibilidade de se socorrer do Poder Judiciário, mas nomeadamente do grau de eficácia da atuação jurisdicional, sobretudo no terreno dos direitos fundamentais. E sendo o aumento do espaço de atuação do Estado o elemento que caracteriza a modernidade, isso também passa pela atuação do Poder Judiciário.

Quanto à continência alegada pela ré, reporto-me aos fundamentos da Decisão proferida as folhas 1232/1247, que analisou essa matéria de natureza processual. E assim o faço também em relação a outra matéria processual: a da competência.

Admite-se a intervenção, a título de “amicus curiae”, da associação denominada ARTIGO 19 BRASIL. Anote-se.

Superadas todas essas questões de conteúdo processual, perscrutemos acerca do conteúdo dos direitos fundamentais que a autora invoca, direitos fundamentais que, em verdade, integram-se, todos, no conteúdo do direito de reunião, que como afirmam GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, é um direito ligado, diretamente e teleologicamente, à formação da opinião pública, a qual constitui um pressuposto necessário do Estado de direito democrático, sendo o direito de reunião por isso um direito fundamental que é de ser englobado entre os “direitos fundamentais democráticos”, justificando sua proteção sobretudo pela dimensão comunicativa geral que o informa. (“CRP – Constituição da República Portuguesa, anotada, v. I, p. 636, Coimbra – Revista dos Tribunais, editores, 2007). E por se tratar de um direito fundamental diretamente ligado à formação da opinião pública, o direito de reunião possui uma especial importância no regime democrático, e exatamente por isso cause tanta preocupação ao Poder político, quando alguém o queira exercer, manifestando-se contrariamente a esse mesmo Poder político. Cabe ao Poder Judiciário proporcionar o necessário a que esse direito fundamental possa ser exercido efetivamente, dentro das condições de exercício que a norma constitucional estabelece.

O núcleo da argumentação desenvolvida pela autora nesta ação civil pública radica no fixar-se o conteúdo essencial do direito fundamental de reunião, o que equivale a perscrutar sua função em nosso sistema de direito positivo. Revelado o conteúdo essencial do direito fundamental de reunião, será então possível analisar como surgem as relações com os bens jurídicos invocados pela ré e que limites se podem impor àquele direito fundamental, enfatizando-se, como adscrevem GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA na obra referida (p. 636), que o direito de reunião justifica-se por sua dimensão comunicativa e essa relação comunicacional que o caracteriza é indispensável ao desenvolvimento da personalidade individual, sendo esse aspecto aquele relevante a analisar-se quando se delimitam as ingerências restritivas emanadas do Estado.

O enunciado normativo do artigo 5º., inciso XVI, da Constituição de 1988 é o seguinte: “todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente” – em uma redação que é muito próxima daquela utilizada por constituições de diversos países, como, por exemplo, Portugal, em cuja Constituição lê-se no artigo 45, I: “Os cidadãos têm o direito de se reunir, pacificamente e sem armas, mesmo em lugares abertos ao público, em necessidade de qualquer autorização”. A doutrina, interpretando esse enunciado normativo, tem distinguindo entre o direito de reunião e o direito de manifestação, embora identifique uma relação de conteúdo e de função entre esses direitos. Em nossa Constituição de 1988, o direito à liberdade de manifestação também está sob proteção, seja quando exercido em uma reunião, seja quando feita em caráter individual. No direito de reunião – dizem JORGE MIRANDA e RUI MEDEIROS -, aquilo que avulta é a própria reunião, o encontro, entre pessoas, mas encontro para falar, discutir, fazer planos, ao passo que no direito de manifestação prevalece a comunicação, para fora, para terceiros; nas reuniões patenteia-se a pluralidade dos participantes, na manifestação o acordo fundamental entre todos relativamente aos conteúdos verbais que pretendem transmitir. Não são, porém, diferenças abissais, que obriguem a separar os dois direitos, para além das especialidades do regime jurídico que se deparam quanto às manifestações (ou a certos tipos de manifestações).” (“Constituição Portuguesa Anotada, tomo I, p. 946, Wolters Kluwer e Coimbra editora).

Por se tratar de um direito de fundo comunicacional, o direito de reunião tem uma importante base psico-sociológica, que foi brilhantemente analisada e dissecada pelo grande literato e ganhador do Prêmio Nobel de Literatura em 1981, ELIAS CANETTI, que a respeito do tema e depois de um estudo que lhe exigiu trinta anos de pesquisa e análise, escreveu a sua conhecida obra “Massa e Poder”, em que analisa o que forma a necessidade do indivíduo de reunir-se em massa, e o que ganhos obtém com isso. Diz ele: “ (…) Na massa ideal, todos são iguais. Nenhuma diversidade conta, nem mesmo a dos sexos. Quem quer que nos comprima é igual a nós. Sentimo-no como sentimos a nós mesmos. Subitamente, tudo se passa então como que no interior de um único corpo (…)”. (“Massa e Poder”, tradução por Sérgio Tellaroli, Companhia das Letras, 1995). Isso permite compreender a natureza sociológica das massas e, por conseguinte, como se deve configurar o direito fundamental de reunião, que é, no fundo, um direito de expressão política, e que por isso exige uma proteção jurídica efetiva que permita que a manifestação surja livremente, e que o Poder Público não interfira no exercício desse direito, a não ser em uma única hipótese prevista no enunciado normativo do artigo 5º, inciso XVI, da Constituição de 1988: quando a reunião não tenha um caráter pacífico, assumindo um caráter de violência.

Aqui entra em questão um importante aspecto a considerar-se na delimitação do conteúdo essencial do direito de reunião e de seus limites, a atuar na forma como se deve harmonizar o exercício desse direito com outros direitos os bens jurídicos aos quais cabe o Estado tutelar, porque o Estado não pode ser ele o agente repressor que, a pretexto de proteger a segurança pública, agindo com excesso, crie as condições adequadas a tornar o protesto agressivo, atuando, pois, como a verdadeira causa da violência que envolve os manifestantes. Uma polícia que aja sem critérios técnicos estabelecidos, ou com critérios que sejam tão flexíveis que não existam em verdade, policiais que, despreparados, ou não conhecem esses critérios ou os aplicam mal, e que possam disparar balas de borracha a esmo, que portem ostensivamente armas de fogo com o objetivo de inibirem os manifestantes, todo esse quadro pode funcionar, sem dúvida, como o elemento que causa a violência, incitando os manifestantes a reagirem a uma repressão policial desmedida. É papel do Estado, portanto, garantir o necessário a que o direito fundamental de reunião seja exercido em toda a plenitude que a norma constitucional prevê e assegura, e para isso deve contar com uma Polícia preparada, que esteja no local não para gerar, ela própria, violência.

O que, contudo, verificou-se durante os protestos populares havidos no ano de 2013, desencadeados a princípio por uma insatisfação quanto ao reajuste no valor da tarifa dos ônibus nesta Capital, é que a Polícia Militar do Estado de São Paulo não estava estrutural e logisticamente preparada para lidar com as manifestações populares, que, é fato, não eram comuns no Brasil, salvo aquelas realizadas em 1985 por ocasião do movimento denominado “Diretas-Já”. De 1985 a 2013, com efeito, o que houve foram manifestações esporádicas, sem uma finalidade específica que pudesse arregimentar um grande parcela de manifestantes. Assim, era mesmo de se esperar que a Polícia Militar do Estado de São Paulo não soubesse agir nessas manifestações populares. Mas o que se viu, em 2013, foi caracterizado por uma absoluta e total falta de preparo da Polícia Militar, que, surpreendida pelo grande número de pessoas presentes aos protestos, assim reunidas em vias públicas, não soube agir, como revelou a acentuada mudança de padrão: no início, uma inércia total, omitindo-se no controle da situação, e depois agindo com demasiado grau de violência, não apenas contra os manifestantes, mas também contra quem estava no local apenas assistindo ou trabalhando, caso dos profissionais da imprensa. Pelo menos dois jornalistas foram vítimas da violência policial nesses eventos.

Daí se poder afirmar que o elemento que causou a violência nos protestos foi o despreparo da Polícia Militar, sobretudo pela falta de um plano de atuação, ou ao menos de um plano de atuação que fosse aplicado em todos os protestos, e que os policiais estivessem a compreender qual o papel que devem exercer em face de um protesto, um papel que, obviamente, não pode ser o mesmo que exercem quando estão a combater criminosos. Cabe aqui chamar a atenção para um especial fato, de que durante os protestos em favor do impeachment, a mesma Polícia Militar de São Paulo, se antes atuara com desmedida violência, ali atuou de forma adequada, buscando proteger o exercício do direito de reunião, o que permitiu que aqueles protestos transcorressem tranquilamente. Isso nos conduz a uma pergunta: teria a Polícia Militar aplicado o mesmo plano de atuação de que se utilizara em 2013, ou conforme a finalidade do protesto aplicou um diferente plano de atuação? É uma questão relevante, porque não se pode olvidar que o direito de reunião é um direito de feição acentuadamente de expressão política, e esse aspecto pode eventualmente determinar uma posição mais rigorosa de um governo em face de protestos que não lhe sejam agradáveis, como pode ser mais tolerante com aqueles que estejam afinados com sua política. Daí porque se impõe ao Estado faça adotar um único plano de atuação, que seja utilizado em todo e qualquer protesto, um plano de atuação que garanta sobretudo a liberdade de reunião e de manifestação, que se trate de um plano previamente estabelecido e conhecido, sobre o qual o cidadão possa conhecer detalhes (salvo alguma informação acerca da qual se deva guardar sigilo, e que isso se possa tecnicamente justificar), porque do contrário é permitir que o Estado aja a seu livre alvedrio, ora para impor uma atuação policial mais rigorosa, ora menos rigorosa, ao sabor de seus interesses políticos.

Agora mesmo estamos a vivenciar nos Estados de São Paulo e no Paraná um consistente movimento de alunos contrários à reforma do sistema educacional, alunos que estão a ocupar escolas, nelas se reunindo como forma de protesto. Invocando um poder de autotutela que não possui, o Estado de São Paulo tem utilizado sua Polícia Militar para, “manu militare”, retirar os alunos dessas escolas, sem buscar a via jurisdicional, necessária e imprescindível para casos nos quais o particular esteja a invocar um direito fundamental, como o direito de reunião, sobretudo quando aquele que está a invocar esse direito está sob especial proteção jurídica conferida pelo Estatuto da Criança e do Adolescente.

Tolerar, pois, que o Governo do Estado de São Paulo adote um plano de atuação de sua Polícia Militar que quiser adotar, como se fosse uma coisa dele, uma política governamental, e não como deve ser encarada, como um coisa pública e de interesse público, desrespeitando direitos fundamentais como os direitos de reunião e de livre manifestação, é viver em um Estado que não pode ser chamado de um “Estado democrático de Direito”.

Destarte, em face da gravidade de todos os episódios narrados na peça inicial, revela-se apropositada esta ação civil pública, que busca trazer a controle do Poder Judiciário essa situação, buscando encontrar-se um ponto de equilíbrio entre dois direitos: o direito fundamental de reunião, a todos garantido, e o direito (dever) da ré, FAZENDA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO, de garantir a ordem pública. Impõe-se, pois, um juízo de ponderação, que objetive harmonizar tais direitos em colisão, cabendo observar que o direito fundamental invocado (o de reunião) por buscar garantir a liberdade coletiva de expressão, exige do Poder Público um dever de não agredir e de se abster de impedir a reunião de quem queira dessa forma democrática manifestar-se.

Sustenta a ré que não está a impedir o exercício do direito de reunião por quem o queira exercer, que sua Polícia Militar age sob critérios técnicos e que somente atua repressivamente quando os protestos deixam de ser pacíficos. Toda essa argumentação nos conduz aos preciosos ensinamentos do filósofo ISAIAH BERLIN, que em seu conhecido “Quatro Ensaios sobre a Liberdade” (editora Universidade de Brasília, p. 31), em que examinou com profundidade as liberdades negativa e positiva, a dizer, a liberdade (negativa) do indivíduo de não sofrer interferência deliberada de outrem, inclusive do Estado, e a liberdade (positiva) de coerção do Estado, chamou a atenção para a necessidade de se estabelecer uma importante distinção entre liberdade e condições de seu exercício, porque o confundi-las pode fazer como o “Grande Inquisidor” em “Os Irmãos Karamázov”, de Dostoiévski, em que o paternalismo pode propiciar as condições de liberdade, mas pode, ao mesmo tempo, retirar a própria liberdade – como está a fazer o Governo do Estado de São Paulo, sob o argumento de que sua Polícia Militar estar a zelar pela proteção à segurança pública, está, em verdade, a retirar a liberdade daqueles que querem, pacificamente, se reunir para exercerem um direito fundamental que a Constituição de 1988 assegura-lhes. Como enfatiza BERLIN nesse ensaio: “Liberdades inúteis devem ser tornadas úteis, mas não são idênticas às condições indispensáveis para sua utilidade”.

Aplicando-se, pois, o princípio da proporcionalidade como forma de controle jurisdicional desse tipo de conflito, verifica-se que a forma de atuação da Polícia Militar nos protestos tem se caracterizado por ser destituída de critérios técnicos adequados e que sejam adotados como padrão a todo tipo de protesto, e que sejam eficientes para a proteção do direito fundamental de reunião, a garantir que tais protestos ocorram em situação de normalidade, atuando repressivamente apenas em situações que o justifiquem, o que quer dizer, quando o caráter pacífico da reunião deixe de existir, providenciando para que identifiquem e isolem aqueles manifestantes que estejam a agir com violência ou praticando crimes, fazendo o possível para que o direito de reunião mantenha-se em condição de normalidade até seu término, com o que se obterá certamente uma máxima efetividade do direito fundamental de reunião.

Examinando quais são as medidas que a DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO reclama sejam adotadas, enumeradas as folhas 91/93, verifica-se que quase todas objetivam garantir de forma razoável o direito difuso de reunião, com a mantença da ordem pública, a ser implementada pela ré, se sua Polícia Militar fizer adotar tais medidas. A harmonização entre o direito de reunião e a garantia da ordem pública pode ser alcançada se tais medidas forem adotadas. E assim, julga-se procedente a pretensão formulada nesta ação civil pública, para obrigar a ré, FAZENDA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO, a adotar essas medidas, que, aliás, não fazem eliminar o poder preventivo da Polícia Militar em sua atuação na segurança pública. Essas medidas propiciam que existam e devam existir as condições em que o exercício da liberdade por aqueles que querem exercer o direito de reunião possam de fato exercê-los, sem o risco de serem agredidos pela Polícia Militar, apenas por estarem reunidos e a protestarem.

Daí porque se obriga a ré a elaborar um projeto de atuação de sua Polícia Militar, a aplicar-se quando se trate de manifestação de populares em protestos, um projeto, que, aliás, é reclamado pelo princípio constitucional da eficiência.

A Polícia Militar deve obviamente estar preparada para agir em face de protestos populares. Agir não significa necessariamente dispersar. Agir deve significar manter a ordem pública, mas atuando a compasso com o objetivo de garantir o direito de reunião e de manifestação. Naturalmente que o uso de armas de fogo pelos policiais ou de munição de elastômero dá ensejo a que policiais menos preparados possam agir com demasiada violência. O controle que a Polícia Militar do Estado de São Paulo vem conseguindo alcançar dentro dos estádios de futebol, sem uso de armas de fogo e de munição de outra natureza, permite confirmar que é plenamente possível que a Polícia Militar possa garantir a ordem pública em protestos populares sem o uso de tais armas. Veda-se, pois, que as armas de fogo, que as balas de borracha e gás lacrimogênio sejam utilizados como armas pela Polícia Militar em protestos exercidos em função do direito fundamental de reunião, salvo em situação excepcionalíssima, quando o protesto perca, no todo, seu caráter pacífico, cabendo à Polícia Militar, se adotado qualquer daqueles instrumentos (armas de fogo, balas de borracha e gás lacrimogênio), informar ao público em geral que circunstâncias justificaram sua ação, e qual o nome do policial militar que determinou a repressão com uso daqueles instrumentos. As filmagens, já realizadas pela Polícia Militar de São Paulo, possibilitarão uma análise das circunstâncias e dos motivos em que a atuação da Polícia Militar tenha agido em uma excepcionalíssima situação.

Esse projeto deve determinar que os policiais militares tenham uma identificação quanto a seu nome e posto, colocada em local visível de sua farda. O cidadão tem o direito de saber o nome do agente policial e de qualquer agente público com quem esteja a lidar.

O projeto deve minudenciar as condições em que haverá a ordem de dispersão dos populares, como providência-limite, indicando que tipo de oficial poderá determiná-la, em que circunstâncias deverá fazê-lo, obrigando-o ainda a divulgar as razões que levou em consideração para assim ter agido, tudo de molde que se possa posteriormente controlar-se o ato administrativo praticado, inclusive por via judicial.

Em nosso Ordenamento Jurídico em vigor, o direito de reunião não é condicionado a um aviso prévio, nem a qualquer outra condição, salvo a que se refere à mantença da ordem pública. A ré não pode, pois, genericamente impor condições de tempo e de lugar ao exercício do direito de reunião. Mas poderá criar as condições necessárias a que o evento venha a ocorrer com maior tranquilidade, se indicar à organização do evento que conta com um oficial que possa atuar como um porta-voz do comando, o que naturalmente criará um meio de comunicação, demonstrando que seu interesse não é o de impedir a reunião, mas de mantê-la em funcionamento sob as condições de segurança pública. Esse canal de comunicação produzirá certamente experiências importantes à logística de atuação da Polícia Militar em protestos populares.

São, portanto, basicamente as mesmas medidas que foram determinadas na Decisão pela qual foi concedida a medida liminar nesta ação civil pública, cuja eficácia foi suspensa em Decisão monocrática dada em agravo de instrumento, Decisão que perde toda a sua eficácia em razão da superveniência desta Sentença, cabendo adscrever que é posição consolidada na jurisprudência e ajustada à lógica das coisas a que determina perca toda a sua eficácia decisão concedida em agravo de instrumento quando proferida sentença, porque a Sentença, uma vez proferida, sobrepõem-se à decisão interlocutória que concede a medida liminar, e contra sentença somente cabe, como recurso adequado, o de apelação. Assim, restaura-se a eficácia de todas aquelas medidas, cuja ordem é integrada como tal no conteúdo desta Sentença, cessando imediatamente a medida liminar concedida em agravo. Com urgência, comunique-se o egrégio Tribunal de Justiça, dando-lhe ciência do conteúdo desta Sentença, para que considere a perda de objeto do agravo do instrumento, ainda não julgado.

À maneira do que se fez destacar na Decisão proferida a folha 1246, é de se notar que nenhuma dessas medidas está a obstaculizar que a ré, por sua Polícia Militar, mantenha a ordem pública em face de protestos. Tais medidas buscam apenas garantir o legítimo exercício do direito fundamental de reunião, em sua convivência com o dever do Poder Público de garantir a ordem pública, observando-se a justa proporção entre tal direito e tal dever.

São procedentes, também, os pedidos de reparação por danos moral social e patrimonial individual, formulados pela autora e secundados pelo MINISTÉRIO PÚBLICO. As imagens apresentadas bem evidenciam a desproporcional violência empregada pela Polícia Militar nos oito eventos referidos na peça inicial, a caracterizar que foi o despreparo da Polícia Militar o elemento causador da violência instalada durante aqueles protestos, em situações, aliás, que se repetiram noutras ocasiões, gerando um dano moral social, a ser reparado no patamar pleiteado pela autora, que se revela condizente com a extensão e características em que o dano sucedeu e que efeitos sociais produziu, inibindo as pessoas ao exercício de um direito que a Constituição lhe assegura, que é o direito de reunirem-se para manifestação e expressão, havendo razão no que observou o MINISTÉRIO PÚBLICO a folha 1444, no sentido de que a truculência policial amedrontou as pessoas, atingindo sua dignidade, na medida em que interferiu indevidamente no exercício de uma liberdade que a Constituição de 1988 prevê. O valor pleiteado, de um milhão de reais para cada um dos oito eventos, em um total de R$8.000.000,00 (oito milhões de reais), quantifica adequadamente a extensão dos danos morais sociais, e esse valor deve ser revertido ao fundo de proteção aos direitos difusos.

E a desproporcional violência policial também atingiu, individualmente, diversas pessoas, caso, por exemplo, dos jornalistas que foram atingidos gravemente por balas de borracha. São pessoas cujo direito patrimonial individual é aqui reconhecido e colocado sob proteção patrimonial nesta ação civil pública, garantindo-se-lhes a recomposição pelos danos patrimoniais que tenham experimentado nesses eventos, danos a serem quantificados em ação individual, caracterizada a prevenção do Juízo. Este provimento jurisdicional coletivo concede, pois, o direito de todo aquele que tiver sido ferido por policiais militares nos eventos em questão à reparação por danos material, observada a coisa julgada material de que trata o artigo 104 do Código de Defesa do Consumidor, aplicado ao regime da ação civil pública.

POSTO ISSO, aplicando o princípio da proporcionalidade e com ele ponderando os interesses em conflito concreto, decidindo deva prevalecer o direito fundamental de reunião que a autora, DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO, invocou, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão, para cominar à ré as medidas explicitadas nesta Sentença, medidas, todas, a serem adotadas no prazo de trinta dias (a contar do momento em que desta Sentença for intimada), de forma que a ré, FAZENDA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO, se recalcitrar no cumprir qualquer dessas medidas, sujeitar-se-á a uma multa diária fixada em R$100.000,00 (cem mil reais), patamar consentâneo com a finalidade de legitimar a coerção à ré, para que faça cumprir o que lhe é judicialmente determinado. PROCEDENTE, outrossim, a pretensão de reparação por danos morais sociais e danos patrimoniais individuais, na forma determinada. Ratifico, pois, a medida liminar concedida, restaurando-lhe a eficácia em consequência de fazer imediatamente cessada a eficácia de Decisão monocrática concedida em agravo de instrumento. Comunique-se o egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo acerca do conteúdo desta Sentença, para as devidas providências. Declaro a extinção deste processo, com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do novo Código de Processo Civil.

Não há condenação em encargos de sucumbência, inclusive quanto a honorários de advogado, cabendo observar a respeito o entendimento fixado pela Súmula 421 do egrégio Superior Tribunal de Justiça.

Publique-se, registre-se e sejam as partes intimadas desta Sentença; a DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO e a FAZENDA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO, pessoalmente.

Sentença a ser submetida a reexame necessário.

São Paulo, em 19 de outubro de 2016.

VALENTINO APARECIDO DE ANDRADE

JUIZ DE DIREITO