A ideologia do processo civil no CPC/2015

IDEOLOGIA DO PROCESSO CIVIL NO CPC/2015

A muitos operadores do Direito passa despercebido que o processo civil é um dos instrumentos ideológicos empregados pelos tribunais como aparelhos estatais de natureza repressiva. Daí a imperiosa necessidade de conhecer qual a ideologia que um código de processo civil adota, não se podendo olvidar, como observou o crítico literário francês, PIERRE MACHEREY, que “a ideologia é essencialmente contraditória, e está crivada de toda a espécie de conflitos, que tenta esconder. Todo os tipos de instrumento são construídos para ocultar estas contradições, mas, ao ocultá-las, estão de algum modo a revelá-las”.

Exatamente o que acontece com a ideologia do CPC/2015 e que explica que esse texto legal esforce-se por dizer que o juiz possui a liberdade de convicção e que a pode efetivamente exercer, que as partes dispõem de um juiz com essa liberdade, quando, em verdade, nenhuma legislação processual brasileira em tempo algum avançou tão e tão profundamente contra a liberdade do juiz, reduzindo-a a ponto de impor ao juiz o respeito absoluto a decisões normativas emanadas de tribunais.

Da mesma forma, o CPC/2015 também quer ocultar o poder de pressão que concedeu aos interesses de grandes grupos econômicos na construção da jurisprudência, favorável em larga medida a um liberalismo de puro mercado como é o nosso na prática (mas não na nossa Constituição).

De há muito os filósofos e cientistas políticos deram-se conta, sobretudo a partir da acuidade de LOUIS ALTHUSSER, de que nenhuma classe consegue manter o controle do poder por longo tempo se a compasso não mantiver uma hegemonia sobre os aparelhos ideológicos do Estado. O livre mercado também percebeu isso, como também se deu conta da importância do processo civil como instrumento ideológico, o que explica a ideologia do CPC/2015.

Não podemos, nós os operadores do Direito, manter a ingênua crença, alimentada infelizmente pela imensa maioria dos processualistas, de que o processo civil é um instrumento técnico e que como tal deve ser encarado. Não, o processo civil não é um instrumento técnico, mas é em sua essência sobretudo um instrumento ideológico de que o Estado e a classe econômica dominante utilizam-se para exercer poder e para o manter com eficiência.

Bem vistas as coisas, considere-se, por exemplo, o que se dá hoje com a execução no processo civil e a grande quantidade de meios executivos que são colocados à disposição do credor para a satisfação de seu crédito, como as ordens judiciais de bloqueios eletrônicos sobre imóveis, dinheiro, rendas, constituindo-se essa novidade legislativa uma exigência que obviamente foi imposta pelos grandes grupos econômicos, que reclamavam que o processo de execução, no CPC/1973, era ineficiente ao não avançar sobre o patrimônio do devedor como deveria, segundo a visão dos credores.

Como observa MARX com a sua acuidade habitual, não são as ideias que determinam as necessidades, mas, ao contrário, são as necessidades que determinam as ideias, o que se pode confirmar pela ideologia adotada pelo CPC/2015 e impressa no processo civil como hoje ele está estruturado no Brasil, transformado em um instrumento que tem por objetivo ser um espelho da ideologia de um estado liberal de mercado.

Quando começamos a ver o CPC/2015 sob essa perspectiva, a nossa compreensão modifica-se totalmente. É a cabal prova de que perdemos a ingenuidade, o que é de fundamental importância para analisarmos a realidade como efetivamente ela é.

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