GRATUIDADE. EFEITOS RETROATIVOS

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. GRATUIDADE PROCESSUAL. BENEFÍCIO CONCEDIDO DURANTE A FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA, COM EFEITOS “EX NUNC”. DECISÃO REFORMADA. EFEITOS RETROATIVOS QUE CONSTITUEM IMPERATIVO LÓGICO E QUE FORMAM A ESSÊNCIA DO BENEFÍCIO DA GRATUIDADE PROCESSUAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO.

RELATÓRIO
(…), representada por seu curador, (…), afirma que, concedida a gratuidade processual, seus efeitos devem retroagir para alcançar atos processuais praticados antes mesmo de sua concessão.
A tutela provisória recursal foi concedida (fls. 70/72).
Recurso tempestivo, dispensado de preparo por força da gratuidade deferida à agravante, e contra-arrazoado (fls. 77/88).
FUNDAMENTAÇÃO
O recurso merece ser provido. Uma imposição de natureza lógica determina que assim o deva ser.
Com efeito, a gratuidade é de ser concedida quando a parte demonstra não possuir as condições financeiras que lhe permitam suportar os encargos do processo judicial, e essas condições financeiras, andando o tempo, podem se modificar, podendo vir a suceder que a parte não mais necessite do benefício, e o terá assim revogado.
Mas pode suceder situação oposta, quando a parte que, a princípio, não contava com a gratuidade, a ela passou a fazer jus, quando se reconhece que a sua situação financeira modificou-se a ponto de tornar impossível que arque com os custos do processo judicial – e o benefício assim lhe é concedido.
Nesse caso, se a parte não dispõe de recursos financeiros que lhe permitam fazer frente com os atos processuais que serão praticados, também não possui, por óbvio, recursos com os quais possa contar para custear os atos praticados antes da gratuidade, porque é imperioso considerar que, se obteve a gratuidade, é porque se lhe reconhece a condição de hipossuficiente, condição que é aferida em um determinado momento, mas que, assim aferida, produz efeitos que se protejam retroativamente e enquanto perdurar a concessão da gratuidade.
Portanto, se é reconhecido à parte que sua situação financeira atual é de ser caracterizada como de hipossuficiência, não haveria sentido em desconsiderar essa mesma situação financeira para, ficticiamente, exigir da parte beneficiada pela gratuidade arque com o custeio de atos processuais anteriores, quando sua situação financeira atual não o permite.
Destarte, seja por um imperativo lógico, seja mesmo pela essência do benefício da gratuidade processual, uma vez concedida no processo, e enquanto subsistir, ela deve prevalecer, alcançando inclusive os atos anteriores ao momento em que foi concedida, como, aliás, é de concluir de acordo com uma razoável intelecção que se faça do artigo 98, parágrafo 3º, do Código de Processo Civil.
POSTO ISSO, ratificando a tutela provisória recursal, pelo meu voto dou provimento a este agravo de instrumento, para reformar a r. decisão agravada, de modo que reconheço que a gratuidade, uma vez concedida, possui efeitos retroativos, alcançando os atos processuais praticados antes de a gratuidade ter sido formalmente concedida.
Como na r. decisão agravada não se fixaram encargos de sucumbência, aqui também não se os fixam.
VALENTINO APARECIDO DE ANDRADE
RELATOR