SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL. BASE DE CÁLCULO DO ADICIONAL DE INSALUBRIDADE PREVISTA NA LEI MUNICIPAL

SP 10.827/1990 (art. 2o). MENOR PADRÃO DE VENCIMENTO DO QUADRO GERAL DE PESSOAL DA PREFEITURA DE SÃO PAULO. NECESSIDADE DE DISTINGUIR-SE O REGIME JURÍDICO-FUNCIONAL GERAL, INSTITUÍDO A PARTIR DA LEI 13.652/2003, DAQUELE REGIME  EXTINTO, PARA DEFINIÇÃO DO QUE SE DEVE FIXAR COMO “MENOR PADRÃO DE VENCIMENTOS

Vistos.

                                      O autor, (…), qualificado a folha 1, é servidor público municipal, e recebe mensalmente o adicional de insalubridade/periculosidade/penosidade, assim apostilado, e essa vantagem pecuniária lhe está sendo paga conforme uma base de cálculo que ao autor afigura-se incorreta, por não levar em conta que a partir da entrada em vigor da Lei Municipal – SP de número 13.652/2003, o menor padrão de vencimento do quadro geral de pessoal passou a ser o correspondente ao do nível “B1-J40”, e não mais aquele que era previsto na Lei 10.827/1990, de forma que pugna por se declarar a existência de relação jurídica que lhe reconheça o direito a que receba o adicional em questão, calculado com base no menor padrão de vencimento, fixado na Lei 13.652/2003, e que a ré, AUTARQUIA HOSPITALAR MUNICPAL – AHM, pague-lhe as diferenças daí decorrentes, observada a prescrição.

                                      Citada, o réu contestou, argumentando que, ao contrário do que o autor sustenta, não sucedeu a extinção do padrão de vencimento identificado como “NO1A”, sendo esse o menor padrão de vencimentos em vigor, dado que a Lei Municipal – SP de número 13.652/2003, que trata apenas do quadro de pessoal de nível básico, não revogou ou fez extinguir a qualquer título o quadro geral de pessoal em nível operacional, conforme faz prova o fato de o Decreto – SP de número 57.499/2006, ao relacionar e divulgar os valores dos diversos padrões e referências do funcionalismo municipal, prever a existência do padrão “NO1A”, sendo esse, pois, aquele que se deve considerar como base de cálculo do adicional de insalubridade, nos termos do que prevê o artigo 2º. da Lei 10.827/1990. Subsidiariamente a essa argumentação, para o caso em que não prevalece, sustenta a ré deva se adotar, como menor padrão de vencimentos, o correspondente ao “BI-J24”.

                                      Assim se coloca, em poucas linhas, a demanda em seu conteúdo, e nesse contexto, FUNDAMENTO e DECIDO.

                                      Quanto ao mérito da pretensão.

                                      De fato, consolidada jurisprudência, consubstanciada sobretudo na Súmula 339 do egrégio Supremo Tribunal Federal, fixou o entendimento de que não cabe ao Poder Judiciário reajustar o valor dos vencimentos do servidor público, ainda que para a aplicação do princípio da isonomia, havendo, pois, a necessidade de que uma lei específica, de iniciativa do Poder Judiciário, preveja o reajuste. Esse entendimento jurisprudencial vem sendo adotado também para as vantagens pecuniárias em geral, cujo valor depende necessariamente de uma Lei que a tenha fixado.

                                      Decerto, estivesse o autor aqui a buscar o reajuste, por meio de uma decisão judicial, ao valor de seus vencimentos, ou a uma vantagem pecuniária que os integra, então nesse caso a improcedência do pedido, por força de aquela jurisprudência, seria medida de rigor.

                                      Mas há que se considerar que o autor não está a pretender um reajuste no valor de seus vencimentos ou de uma vantagem pecuniária que mensalmente recebe, no caso o adicional de insalubridade/periculosidade/penosidade, senão que está a se apoiar na Lei que instituiu tal vantagem pecuniária, apenas obtemperando que, em se tendo modificado o elemento sobre o qual incide a base de cálculo, o valor deve corresponder a esse mesmo elemento.

                                      Com efeito, a Lei que instituiu o adicional de insalubridade, a de número 10.827/1990, fixara a sua base de cálculo, que deveria corresponder ao menor padrão de vencimentos do quadro geral da Prefeitura de São Paulo, não tendo fixado, pois, que padrão seria esse, mas apenas que fosse o menor dentre eles.

                                      Daí que, em tendo se alterado esse padrão (o menor padrão), a base de cálculo do adicional de insalubridade deve corresponder àquele padrão de vencimentos que então se passou a adotar, sem que isso constitua modificação da base de cálculo, ou reajuste no valor do adicional de insalubridade. Destarte, como a Lei Municipal – SP de número 13.652/2003 passou a fixar que o menor padrão de vencimentos do quadro geral da Prefeitura de São Paulo seria o correspondente ao do cargo B1-J40, e sobre esse padrão que o adicional de insalubridade deveria e deve ser calculado e pago, o que conduz a que se  reconheça razão ao que argumenta e pugna o autor, apenas com a ressalva de que a prescrição quinquenal sobre as parcelas é de ser observada.

                                      A propósito do que aduz a ré, no sentido de que o menor padrão de vencimentos em vigor seria o correspondente ao padrão “N01A”, já que a Lei – SP de número 13.652/2003 não o teria revogado ou feito extinguir por qualquer forma, tal argumentação não subsiste. Há que se considerar, com efeito, que a finalidade da Lei 10.827, editada em 1990, foi a de estabelecer, como base de cálculo do adicional de insalubridade, o padrão de vencimentos que, ao tempo do pagamento dessa vantagem pecuniária, constituísse o menor padrão de vencimento, dentro do  “quadro geral de pessoal da Prefeitura”, conforme dicção da norma, remetendo o intérprete à necessidade de verificar o que se entende como tal, conforme prevê o conjunto da legislação do Município de São Paulo, aplicado ao conjunto de seus servidores.

                                      Remontando a 1990, quando entrou em vigor a Lei 10.827, estava em vigor a Lei 10.430, de 29 de janeiro de 1988, que dispondo sobre a reorganização dos quadros de pessoal da Prefeitura, estabeleceu, em seu artigo 2º., que os cargos da administração direta seriam distribuídos em diversos quadros, e dentre eles aquele que devia ser considerado o “quadro geral”, que abarcaria todos os servidores públicos que não ocupassem determinados cargos que, à conveniência do Legislador, pareceu adequado constituírem quadros “especiais”, caso, por exemplo, do quadro do ensino ou da guarda civil metropolitana. A bem evidenciar que, por “quadro geral de pessoal”, há que entender o quadro que abrange a grande maioria dos servidores públicos do município de São Paulo, e que não estejam a ocupar cargos daqueles quadros especiais enumerados na referida Lei.

                                      É nesse mesmo contexto, pois, que se deve considerar a Lei editada em 2003, a de número 13.652, que, alterando a estrutura administrativa da Prefeitura de São Paulo, adotou um novo regime jurídico-funcional, criando o “Quadro de Pessoal do Nível Básico”, que abrange o conjunto de cargos qualificados como de nível básico, que formam os cargos de menor padrão de vencimentos na estrutura administrativa da ré.

                                      De relevo observar que os servidores públicos municipais poderiam optar por se manter no regime jurídico em que estavam, ou então aderir ao novo regime jurídico instituído pela Lei 13.652, prevendo o artigo 28 dessa Lei a forma e o prazo em que a opção pelo regime jurídico-funcional deveria ocorrer, fixando a Lei também que, no caso em que o servidor público optasse por se manter no regime em que estava, continuaria a receber seus vencimentos de acordo com a escala de vencimentos adotada anteriormente à entrada em vigor da Lei 13.652 (parágrafo 1º. do artigo 28). Do que se pode concluir que não esses cargos, mais propriamente seus ocupantes é que deixaram de figurar dentre aqueles que compõem o “quadro geral de pessoal”, para se manterem em uma espécie de quadro especial, que perduraria e perdurará até que o último servidor, não optante,  esteja em atividade.

                                     Destarte, não há sentido em que querer argumentar, como faz a ré,  que como há ainda servidores públicos que optaram por não aderir ao regime jurídico-funcional instituído pela Lei 13.2003,  deva-se considerar o padrão de vencimentos que se aplicam a esses mesmos servidores como base de cálculo para o adicional de insalubridade. É que a Lei 10.827/1990, ao se referir ao menor padrão de vencimento do “quadro geral de pessoal”, quis que se considerasse o regime jurídico geral dos servidores públicos municipais, e não um regime jurídico específico e temporário (que durará apenas pelo tempo em que ainda estiverem em atividade os servidores que não optaram pelo regime jurídico geral). De resto, o ter a Lei 13.652 previsto a opção pelo regime jurídico-funcional que instituiu, evidencia que esse é o regime jurídico que deve ser considerado como geral.

                                      Portanto, ao se referir expressamente a “quadro geral de pessoal”, quis o Legislador, por óbvio, que se considerasse, na aferição da base de cálculo do adicional de insalubridade, o regime jurídico geral adotado a cargos e padrões de vencimento, e não um regime jurídico específico e temporário, em vigor apenas porque há ainda servidores remanescentes de um regime jurídico já extinto.

                                      Não subsiste, por fim, o que argumenta a ré no sentido de que afrontaria a norma do artigo 37, inciso XIII, da Constituição de 1988 o vincular-se o valor do adicional de insalubridade a um padrão de remuneração dos servidores públicos municipais. Com efeito, essa norma constitucional não tem o alcance que a ré pretende de seu conteúdo extrair, porque sua finalidade é a de vedar que haja vinculação salarial entre cargos de carreiras distintas, nada dispondo, pois, quanto à base de cálculo das vantagens pecuniárias, que não encontra, portanto, a limitação que a ré sustenta existir.

                                      Sendo por isso procedente a pretensão, declara-se a existência de relação jurídica que faz reconhecer em favor do autor o direito a receber o adicional de insalubridade, calculado com base no padrão de vencimentos correspondente ao nível “B1-J40”, desde o momento em que esse padrão tornou-se o menor padrão de remuneração, o que ocorreu quando da entrada em vigor da Lei 13.652/2003. Mas a como se fez referência, para efeitos patrimoniais, a prescrição sobre parcelas é de ser aplicada, o que determina que o termo inicial da aplicação daquele padrão considere a prescrição, a incidir ela sobre as parcelas vencidas há mais de cinco anos contados do momento do ajuizamento desta causa. A ré é condenada a apostilar tal base de cálculo do adicional de insalubridade, para o observar no  pagamento das prestações vincendas.

                                      E para as parcelas vencidas, observada a prescrição, incidirá a correção monetária, calculada a partir do momento em que cada parcela foi paga, computada a correção monetária com base na Lei federal de número 11.960/2009. Incidentes juros de mora a contar da citação, e calculados também segundo a Lei federal de número 11.960/2009. Verba alimentar.

                                      Quanto à impugnação de valores, que a ré arguiu subsidiariamente, a considerar-se para o caso de que viesse a ser, como é procedente a pretensão, há que observar que embora se tenha a obrigatoriedade legal de a sentença, nas ações de competência do Juizado Especial de Fazenda Pública, ser líquida, isso não quer dizer que se deva necessariamente quantificar o valor da condenação, porque poderá ocorrer, conforme o caso, que na sentença seja de se fixarem apenas os critérios que deverão ser empregados para a quantificação do valor, sem que a sentença deixe por isso de ser líquida. Não se há confundir, pois, sentença líquida com sentença que fixa valor certo à condenação, porque poderá ocorrer que uma sentença seja líquida e não tenha quantificado o valor certo da condenação, embora fixe quais os critérios pelos quais se poderá chegar ao valor  da condenação, a apurar-se na fase do cumprimento da sentença. Assim, feita essa ressalva, neste caso será de se quantificar, na fase do cumprimento da sentença,  o valor certo da condenação com base  da tabela de remuneração de cargos e salários  adotada pela Prefeitura de São Paulo em vigor corresponde ao tempo em que o adicional de insalubridade foi pago ao autor. Pois bem: ao tempo em que iniciar a fase do cumprimento da sentença, caberá ao autor  apresentar a memória de cálculo, indicando que tabela de remuneração de cargos e salários adotou, de modo que, em havendo controvérsia a respeito, decida-se acerca do tema.

                                      POSTO ISSO, JULGO PROCEDENTE o pedido, declarando a existência de relação jurídica que faz reconhecer em favor do autor  o direito a receber o adicional de insalubridade, calculado com base no padrão de vencimentos correspondente ao nível “B1-J40”, desde o momento em que esse padrão tornou-se o menor padrão de remuneração, o que ocorreu quando da entrada em vigor da Lei 13.652/2003, mas observada a prescrição quinquenal sobre parcelas, cominando-se a ré, AUTARQUIA HOSPITALAR MUNICIPAL, na obrigação  de apostilar esse novo padrão de vencimentos como base de cálculo do adicional de insalubridade, condenado também no pagamento das prestações vencidas, com incidência de correção monetária e juros de mora, tal como determinado. Feita a ressalva quanto a caber ao autor  apresentar a memória de cálculo, indicando que tabela de remuneração de cargos e salários adotou, de modo que, em havendo controvérsia a respeito, decida-se acerca do tema.  Verba alimentar. Declaro a extinção deste processo, com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do novo Código de Processo Civil.

                                      Quanto a encargos de sucumbência, prevalece a regra do artigo 55 da Lei federal de número 9.099, de modo que, em não se tendo caracterizado a prática pela ré de ato de litigância de má-fé, não se lhe pode impor o pagamento de qualquer encargo dessa natureza, sequer honorários de advogado.

                                      Publique-se, registre-se e sejam as partes intimadas desta Sentença.

                                      São Paulo, em 16 de abril de 2019.

                                      VALENTINO APARECIDO DE ANDRADE

                                               JUIZ DE DIREITO