SERVIDOR PÚBLICO INATIVO. INDENIZAÇÃO POR “HORAS CREDORAS” NÃO USUFRUÍDAS. ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. INDENIZAÇÃO NEGADA POR FORÇA DE PREVISÃO LEGAL E JUSTA CAUSA
Vistos.
O autor, (…) qualificado a folha 1, é servidor público inativo dos quadros do egrégio Tribunal de Justiça deste Estado, e conforme a certidão que apresenta (folha 15), acumulou horas credoras, das quais não usufruiu, pretendendo, pois, seja-lhe reconhecido o direito a obter indenização.
Citada, a ré, FAZENDA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO, contestou, arguindo a prescrição do fundo de direito, e sustentando, quanto ao mérito da pretensão, que não há previsão em Lei quanto à indenização de horas credoras, sobretudo por não se tratar de um período que a Lei caracterize como de “descanso obrigatório”, caso, por exemplo, de férias.
Nesse contexto, FUNDAMENTO e DECIDO.
A prescrição, no caso presente, deve contar-se desde o momento em que o autor passou à inatividade, porque o fundamento da demanda relaciona-se diretamente a não ter o autor podido usufruir quando em atividade, de “horas credoras”. Assim, aposentado em 18 de agosto de 2017 (cf. folha 12), o prazo prescricional teve ali início – e por isso não se configura a prescrição.
Quanto ao mérito da pretensão.
No início, constituindo apenas um princípio nuclear em nosso ordenamento jurídico, depois erigido a uma regra legal (Código Civil de 2002, artigo 884), a vedação ao enriquecimento sem causa aplica-se também à relação jurídica que o servidor público mantenha com a Administração.
Mas é sempre necessário perscrutar se, de fato, há ou não uma “justa causa”, por se tratar de um requisito indispensável à indenização.
Nesse contexto, analisemos o que argumenta a ré no sentido de que, em relação às “horas credoras” que o autor acumulou em sua vida funcional, não há previsão em Lei que legitime seu recebimento, e que se trataria de um tipo de benefício criado por norma administrativa do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. No que está com razão a ré.
Com efeito, diante de uma necessidade de ordem prática, qual seja, a de seus servidores realizassem atividades em horários além de sua jornada normal de trabalho (o que no regime da Consolidação das Leis de Trabalho poder-se-ia chamar de “horas extras”), o Tribunal de Justiça, em ato normativo próprio, criou o que na prática se convencionou chamar de “horas credoras”, que deveriam formar um banco de horas do servidor público, para delas se utilizar em tempo de descanso. Posteriormente, o mesmo Tribunal acabou por prever a possibilidade de o servidor público, ao inativar-se, ser indenizado por horas credoras das quais não pudesse ter usufruído quando em atividade.
Ocorre, entretanto, que, como bem observou a ré, essa possibilidade acabou expressamente vedada pelo mesmo Tribunal, que em um regulamento editado a partir de 1996, estabeleceu a obrigatoriedade de o servidor público usufruir das horas credoras, “antes de sua aposentação ou exoneração”.
Assinale-se, porque, de relevo que o autor aposentou-se em 2017, de forma que à época já vigia a nova regra.
É nesse contexto, pois, que se deve perquirir se há “justa causa” que desobrigue a ré de indenizar o autor pelo saldo de horas credoras. E a resposta é nesse sentido, porque não é dado ao autor o direito de invocar o enriquecimento da Administração, porque há uma justa causa que veda a indenização.
POSTO ISSO, JULGO IMPROCEDENTE o pedido, declarando a extinção deste processo, com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil.
Quanto a encargos de sucumbência, prevalece a regra do artigo 55 da Lei federal de número 9.099, de modo que, em não se tendo caracterizado a prática pelo autor de ato de litigância de má-fé, não se lhe pode impor o pagamento de qualquer encargo dessa natureza, sequer honorários de advogado.
Publique-se, registre-se e sejam as partes intimadas desta Sentença.
São Paulo, em 15 de outubro de 2018.
VALENTINO APARECIDO DE ANDRADE
JUIZ DE DIREITO