PRESCRIÇÃO DO FUNDO DE DIREITO X PRESCRIÇÃO SOBRE PARCELAS. CONTROVÉRSIA QUANTO A DETERMINADO REGIME JURÍDICO, O QUE FAZ INCIDIR A PRESCRIÇÃO DO FUNDO DE DIREITO, SENDO IRRELEVANTE QUE EXISTAM EFEITOS PATRIMONIAIS QUE POSSAM SE PROJETAR NO TEMPO

Processo número 1053172-79-2017

3ª. Vara do Juizado Especial da Fazenda Pública

Comarca da Capital

 

Vistos.

 

Pronuncio a prescrição do fundo de direito, procedendo-se, pois, ao julgamento conforme o estado do processo. Com efeito, os autores, que são ferroviários inativos ou pensionistas de ferroviários, estão a pretender a aplicação à sua esfera jurídico-funcional de efeitos gerados por um dissídio coletivo que está em vigor desde 2005. Daí que a pretensão que formulam nesta demanda está atingida pela prescrição do fundo de direito.

 

É certo que, em sendo concedida a pretensão, os efeitos projetar-se-iam no futuro, sobre o benefício que é pago mensalmente, o que, contudo, não significa que o lapso prescricional tenha se renovado ao longo do tempo, porquanto há que se considerar que o núcleo desta demanda radica na extensão de reajuste salarial contemplado em um dissídio coletivo em vigor desde 2005.  Exatamente a temática central colocada sob controvérsia nesta demanda, dado que os autores querem que se lhes estenda a aplicação de um dissídio coletivo estabelecido para categoria de ferroviários diversa daquela a que fazem parte, sobre o que a ré controverteu.

 

Com efeito, embora a aplicação do reajuste pretendido pelo autor em função de um determinado regime jurídico, se concedida, traria uma repercussão nos valores mensais que lhe são pagos, isso não quer significar que o lapso prescricional renove-se a cada pagamento mensal. É chegada a hora, pois, de desimplicar o regime jurídico da prescrição a adotar-se quando a pretensão formulada em Juízo radica nesse tipo de obrigação material subjacente, de forma que se dê à r. Súmula de número 85 do Egrégio Superior Tribunal de Justiça uma correta intelecção. 

 

Segundo essa Súmula, nas relações jurídicas de trato sucessivo em que a Fazenda Pública figure como devedora, quando não tiver sido negado o próprio direito reclamado, a prescrição atinge apenas as prestações vencidas antes do quinquênio anterior à propositura da ação. Mas a renovação do lapso prescricional somente pode ocorrer quando  o objeto da controvérsia não diz com o núcleo da respectiva relação jurídico-material, que nesse caso não é negada pela Administração Pública, ou por ela é aceita. Então nesse caso, quando não se controverte quanto ao direito que está envolvido na respectiva relação jurídico-material, o que cabe delimitar é apenas o espaço temporal sobre o qual o pronunciamento jurisdicional implementará seus efeitos, afastando-se aquele atingido pela prescrição quinquenal. 

 

Mas quando a Administração Pública nega a existência do direito subjetivo, não o reconhecendo na esfera administrativa, como ocorre no caso em questão, então aqui  a prescrição a ser examinada é aquela que se refere ao próprio direito. De forma que ainda que a obrigação seja de trato sucessivo, o lapso prescricional não se renova mês a mês, devendo ser contado do momento em que se configurou a lesão ao suposto direito.

 

De modo que o que se deve considerar, no exame da prescrição, é o que constitui objeto da pretensão processual. Assim, se a discussão sobranceira diz com a adoção de determinado regime jurídico, impõe-se verificar desde quanto esse regime está em vigor, para definir-se se ainda é dada ao autor a pretensão processual que lhe permita discuti-lo em Juízo, ainda que se cuide de uma relação de trato sucessivo.

 

Esta ação foi proposta em 2017, quando de há muito superado o prazo prescricional previsto no Decreto Federal de número 20.910/1932.

 

POSTO ISSO, caracterizada a prescrição do fundo de direito, declaro a extinção do processo, com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso II, do novo Código de Processo Civil. 

 

Quanto a encargos de sucumbência, prevalece a regra do artigo 55 da Lei federal de número 9.099, de modo que, em não se tendo caracterizado a prática pelos autores de ato de litigância de má-fé, não se lhes pode impor o pagamento de qualquer encargo dessa natureza, sequer honorários de advogado. 

 

Publique-se, registre-se e sejam as partes intimadas desta Sentença. 

 

São Paulo, em 14 de janeiro de 2020.

 

VALENTINO APARECIDO DE ANDRADE

JUIZ DE DIREITO