PLANO MÉDICO. COBERTURA CONTRATUAL QUE EXPRESSAMENTE EXCLUI O CUSTEIO DE HONORÁRIOS DE MÉDICO NÃO CREDENCIADO. CLÁUSULA DECLARADA VÁLIDA, PORQUE ADEQUADA A ASPECTOS DA LIBERDADE CONTRATUAL E AO EQUÍLIBRO ECONÔMICO-FINANCEIRO DO QUE EFETIVAMENTE CONTRATADO

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PODER JUDICIÁRIO
SÃO PAULO
Comarca de São Paulo – Capital

Juízo de Direito da 3ª Vara Cível

Processo número 1011347-82.2020
Juízo da 1ª. Vara Cível – Foro Regional de Pinheiros
Comarca da Capital

​Vistos.

​A autora (…) qualificada a folha 1, questiona a validez de cobrança que lhe está a fazer a ré, (…) , estabelecida nesta Capital, alegando a autora que a cobrança a título de honorários médicos não lhe pode ser feita porque coberta pela contrato que há vinte e sete anos firmou com a ré, dado que o hospital em que o atendimento médico foi realizado pertence à rede credenciada da ré, e que não lhe coube escolher o médico responsável pelo tratamento, o que faz concluir, segundo a autora, que a cobertura contratual há que prevalecer, de modo que ao final se declare a inexistência de relação jurídica, para a desobrigar do pagamento. Adotado o procedimento comum.

​Negada a concessão da tutela provisória de urgência, insurgiu-se a autora, interpondo recurso, não havendo nos autos notícia quanto à concessão de efeito ativo, ou de seu julgamento.

​Citada, a ré contestou, aduzindo que há se considerar o que prevê o contrato celebrado com a autora, e segundo esse contrato não lhe competia a obrigação de arcar com o pagamento de atendimento médico-hospitalar quando o prestador do serviço não se encontrava “referenciado” à época em que o serviço foi prestado, porque segundo expressamente consta do contrato a cobertura circunscreve-se à internação em unidade de terapia intensiva em hospital da rede credenciada, com o atendimento por médico que também esteja credenciado, o que a autora não cuidou observar, destacando a ré que, em se tratando de um hospital cujo corpo clínico é “aberto”, pode suceder que determinados médicos não sejam “referenciados” junto ao plano médico, e que por isso, em se limitando a cobertura contratual ao custeio da internação e dos procedimentos médicos, os honorários devidos a médico não credenciado correm por conta do beneficiário.

​Réplica as folhas 201/207.

​É o RELATÓRIO.

​FUNDAMENTO e DECIDO.

​A relação jurídico-material que forma o objeto desta lide é exclusivamente de direito, o que autoriza se proceda ao julgamento antecipado da lide. De resto, as partes assim o requereram.

​Registre-se que não há matéria preliminar que penda de análise.

​O contrato firmado entre as partes, cujo objeto é a prestação de serviços que se configuram como um plano de saúde, prevê a existência de uma “rede credenciada”, a qual compreende um conjunto de médicos, laboratórios, clínicas e hospitais que podem ser utilizados de acordo com o plano contratado, e uma vez utilizada pelo beneficiário do contrato os serviços prestados por essa “rede credenciada”, então nesse caso a cobertura contratual prevalece, para garantir ao beneficiário nada despenda com o respectivo pagamento, o qual, contudo, é de ser exigido se os serviços são prestados por hospital ou por médico que não estejam integrados a essa “rede credenciada”.

​No caso em questão, a autora, sofrera um grave acidente que lhe causou um traumatismo crânio-encefálico, e em situação de urgência necessitou de tratamento médico que lhe foi dispensado pelo hospital “Albert Einsten”, ali permanecendo internada, submetida tanto a exames quanto a dois procedimentos cirúrgicos.

​A ré autorizou que os procedimentos necessários ao estado clínico da autora fossem realizados, e assim cobertos pelo contrato, mas ressalvou que essa cobertura não abrangeria os honorários do médico, porque esse médico não integrava a “rede credenciada”, a que o contrato refere-se.

​De relevo observar que, em comunicação escrita, adscrita aos termos do contrato e em linguagem bem precisa e clara, a ré comunicara a autora de que, em se utilizando da “rede credenciada”, a autora nada despenderia com o tratamento médico de que necessitasse (cf. folha 4).

​Sucede, entretanto, que o médico que cuidou do tratamento dispensado pela autora e que realizou os procedimentos cirúrgicos não integrava a “rede credenciada” da ré, de modo que esta validamente não assumiu a obrigação de arcar com os custos de seus honorários, comunicando a autora que esse pagamento sobre-excedia os limites do contratado.

​No que está com razão a ré, pois que do contrato consta, em linguagem bastante clara seja quanto ao conteúdo, seja quanto a seus efeitos, que a cobertura contratual para procedimentos médicos, inclusive honorários, limitava-se a serviços prestados por médicos que integrassem o quadro de profissionais credenciados pela ré, cujos nomes poderiam ser facilmente consultados pela autora.

​É fato que a autora necessitava de um tratamento médico de urgência, e esse tratamento lhe foi dispensado e custeado pela ré, salvo quanto aos honorários médicos, porque o médico que atendeu à autora no hospital “Albert Einstein” não integrava a rede credenciada da ré.

​Não subsiste, pois, o argumento da autora no sentido de que não escolhera o médico e que esse médico estava a atuar no hospital “Albert Einsten”, e que se o procedimento foi autorizado, isso abarcaria os honorários médicos. Como cuidou esclarecer a ré, alguns hospitais, como no caso do “Albert Einsten”, há um corpo clínico “aberto”, o que significa que nele atuam médicos que podem ou não ser credenciados em determinados planos de saúde, e que cabe ao beneficiário do plano confirmar se o médico está ou não nessa rede, assumindo o risco de ter que pagar seus honorários se acaso não esteja, como ocorreu no caso da autora.

​Destaque-se a autora mantém com a ré o contrato há tempo considerável, de modo que tinha ou deveria ter pleno conhecimento dos limites da cobertura contratual, a qual, de resto, consta de forma clara em cláusulas que integram o contrato. A propósito, essa limitação contratual quanto à “rede credenciada” é perfeitamente consentânea com a liberdade contratual e com o equilíbrio das partes contratantes, de modo que não se poderia exigir da ré o custeio de algo que não está coberto, ou como no caso, expressamente excluído da cobertura contratual.

​Analisado, pois, o importante aspecto que envolve o equilíbrio contratual em face das cláusulas nele embutidas, daí decorre que não seria justo exigir da ré fosse obrigada pelo custeio de honorários médicos, quando o serviço prestado à autora deu-se por um médico que não integrava a rede credenciada e abarcada nos limites do contrato, do que a autora tinha ou deveria ter pleno conhecimento, previstos expressamente em cláusula do contrato, com a utilização de uma redação clara e inequívoca.

​POSTO ISSO, JULGO IMPROCEDENTE o pedido, declarando a extinção deste processo, com resolução do mérito, nos termos do artigo 485, inciso I, do Código de Processo Civil.

​Condeno a autora no pagamento da taxa judiciária e despesas processuais, com atualização monetária desde o respectivo desembolso, e honorários de advogado, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, devidamente corrigido. Observe-se que, declarado improcedente o pedido, prevê o artigo 85, parágrafo 2º., do CPC/2015, que a base de cálculo deva ser o valor da causa, sobretudo quando por ele se puder quantificar, com objetiva precisão, qual o proveito econômico que a autora obter, não fosse sucumbente, o que determinou a adoção do valor da causa como base de cálculo dos honorários advocatícios, como justa forma de remunerar o trabalho realizado pelos patronos da ré.

​Publique-se, registre-se e sejam as partes intimadas desta Sentença.

​São Paulo, em 4 de março de 2021.

​VALENTINO APARECIDO DE ANDRADE
​JUIZ DE DIREITO