LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. AUTOR QUE MANIPULA A DESCRIÇÃO DA RELAÇÃO JURÍDICO-MATERIAL, OMITINDO DOLOSAMENTE ELEMENTOS ESSENCIAIS PARA A COMPREENSÃO DA LIDE, COM A INTENÇÃO DE LEVAR A EQUÍVOCO O JULGADOR. VIOLAÇÃO DO DEVER JURÍDICO-LEGAL DE DIZER A VERDADE. MULTA APLICADA

Processo número 1035171-75.2019

3ª. Vara do Juizado Especial da Fazenda Pública

Comarca da Capital

 

Vistos.

 

Afirma o autor, (…), qualificado a folha 1, ter sido vítima de indevida prisão em flagrante, por crime que não cometeu, agravado o dano por ter sido decretada a sua prisão preventiva, permanecendo injustamente preso por treze dias, situação que somente deixou de subsistir depois que o Tribunal de Justiça de São Paulo concedeu habeas corpus, reconhecendo a ilegalidade em sua prisão,  buscando o autor nesta demanda que ajuizou contra a FAZENDA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO a reparação dos danos morais que alega ter suportado.

 

Citada, a ré contestou, sustentando que a realidade material descrita pelo autor não corresponde à verdade, pois que a revogação da prisão em flagrante e da prisão preventiva não se deu porque a ordem fora declarada ilegal pelo Tribunal de Justiça, senão que foi revogada por se reconhecer como prevalecente a primariedade do autor, deixando o autor de informar que houve denúncia pelo Ministério Público acerca do crime imputado ao autor (de roubo), que a denúncia foi recebida e que há processo ainda em curso.

Assim se coloca, em poucas linhas, a demanda em seu conteúdo, e nesse contexto, FUNDAMENTO e DECIDO.

 

Quanto ao mérito da pretensão.

 

O autor não descreveu os fatos de modo que correspondessem à verdade, dado que omitiu que a sua prisão preventiva havia sido revogada porque o Tribunal de Justiça considerou a sua primariedade, e não porque esse mesmo Tribunal reconhecera a ilegalidade na prisão, como havia afirmado na peça inicial. 

 

Como também omitiu o fato de que houve denúncia do Ministério Público quanto ao crime imputado (de roubo), que essa denúncia foi recebida, e ainda que o processo está ainda em curso. São informações essenciais para bem compreender a realidade material submetida a julgamento nesta lide, e que não podiam ser manipuladas pelo autor no sentido de suprimi-las do conhecimento do Juízo. 

 

Como bem destacou a ré, em nenhum momento ou em nenhuma passagem do v. Acórdão, o Tribunal de Justiça declarou ou reconheceu ter havido ilegalidade na prisão do autor, seja a prisão em flagrante, seja a preventiva, senão que apenas cuidou ponderar que a ordem de prisão revelava-se excessiva nas circunstâncias do caso, dado que o autor era primário. 

 

Diante desse contexto, pelo que é dado analisar nos limites cognitivos desta demanda, não se configura tenha havido prisão ilegal, ou que o encarceramento do autor por treze dias também o fosse ilegal. Daí a improcedência do pedido. 

 

Consideremos, outrossim, se o autor violou o dever de dizer a verdade, dever que está fixado no artigo 77, inciso I, do Código de Processo Civil, e se violou esse dever dolosamente, ao omitir importantes elementos de informação quanto à relação jurídico-material sobre a qual formulara a pretensão de reparação de danos. Pois que além de ter deixado  o autor de informar que a revogação de sua prisão decorrera de o Tribunal de Justiça ter considerado a sua primariedade, afirmou que o Tribunal reconhecera a ilegalidade da prisão, o que não corresponde à verdade dos fatos. Constata-se, pois, que o autor, dolosamente, manipulou a “verdade” dos fatos, para tentar induzir a erro o juízo. Configura-se a prática pelo autor de litigância de má-fé, e por isso o condeno a pagar multa fixada em 10% (dez por cento) sobre o valor atribuído à causa. O fato de contar com a gratuidade não obsta que lhe exija o pagamento da multa.

 

POSTO ISSO, JULGO IMPROCEDENTE o pedido, declarando  a extinção deste processo, com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do novo Código de Processo Civil. Aplicada sanção pecuniária ao autor pela prática de ato que configura litigância de má-fé.

 

Quanto a encargos de sucumbência, tendo o autor praticado ato que caracteriza a prática de litigância de má-fé, condeno-o no pagamento da taxa judiciária, de despesas processuais, estas com atualização monetária a partir do desembolso, e honorários de advogado, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atribuído à causa. 

 

Publique-se, registre-se e sejam as partes intimadas desta Sentença. 

 

São Paulo, em 6 de março de 2020.

 

VALENTINO APARECIDO DE ANDRADE

JUIZ DE DIREITO