IPVA – IMPOSTO SOBRE VEÍCULO AUTOMOTOR.

APLICAÇÃO, POR ANALOGIA, DO ARTIGO 130, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL. SUB-ROGAÇÃO DE DÉBITOS ANTERIORES NO PREÇO DA ARREMATAÇÃO


Processo número
1042658-67.2017

3ª. Vara do Juizado Especial da Fazenda Pública

Comarca da Capital

                                      Vistos.

                                      Discute-se nesta ação se aquele que adquiriu em hasta pública veículo automotor pode ou não ser responsabilizado pelo pagamento do IPVA – Imposto sobre Veículo Automotor, relativo a fatos geradores ocorridos antes da aquisição da propriedade por essa forma.

                                      Com efeito, sustenta a autora (…), qualificada a folha 1, que em tendo adquirido por hasta pública o veículo descrito a folha 2, não pode ser responsabilizada pelo pagamento do IPVA referente a fatos geradores ocorridos anteriormente à sua aquisição, porque, segundo o artigo 130, parágrafo único,  do Código Tributário nacional, sub-rogam-se no preço da arrematação os tributos existentes até então, pugnando, pois, por se declarar a inexistência de relação jurídico-tributária, para que se seja desobrigada de suportar a exação, permitindo-se-lhe, outrossim, obter a transferência de propriedade do veículo e seu licenciamento, sem o pagamento desse imposto.

                                      Pleiteou e obteve a concessão de tutela provisória de urgência de natureza cautelar (folhas 26/27), não se registrando a interposição de recurso.

                                      A ré, FAZENDA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO, citada, contestou, sustentando, em resumo, que o artigo 130, parágrafo único, do Código Tributário nacional aplica-se apenas a tributos incidentes sobre imóveis, e que no caso do IPVA a regra a aplicar-se é a do artigo 131 do mesmo Código.

                                      Nesse contexto, FUNDAMENTO e DECIDO.

                                      Por considerar que a aquisição em hasta pública é uma forma de aquisição originária da propriedade, e ainda que na arrematação em processo judicial não há uma verdadeira venda, por não existir a vontade do proprietário de vender, caracterizando-se uma espécie de representação legal (a dizer, uma expropriação legal, posição defendida por CHIOVENDA), fixou o Código Tributário nacional a regra de que sobre o preço da arrematação deva se dar a sub-rogação de todos os tributos devidos até a data anterior a essa forma de aquisição da propriedade. É o que prevê o parágrafo único do artigo 130, regra que está inserida na seção que trata da responsabilidade tributária dos sucessores.

                                      A questão que a ré provoca é quanto a aplicar-se tal regra ao IPVA, argumentando que como o “caput” do artigo 130 refere-se a impostos incidentes sobre imóvel, e como o IPVA incide sobre a propriedade de veículo, que é um bem móvel, a sub-rogação não ocorreria, e por isso a responsabilidade de autora, como adquirente, seria de prevalecer, por aplicação do artigo 131 do Código Tributário nacional.

                                      Mas se deve considerar o que preveem os artigos 107 e 108 do Código Tributário nacional, nomeadamente a analogia. Como ensina ALIOMAR BALEEIRO:

Interpreta-se analogicamente quando se busca em outra disposição expressa o princípio jurídico estabelecido para casos afins, idênticos em sua natureza e efeitos (…)”. (Direito Tributário Brasileiro, p. 434, 10ª. edição, Forense editora).

                                      Cabe adscrever, ainda na esteira do mestre BALEEIRO, que a analogia tem aplicação no campo do Direito Tributário, por se considerar que se trata de um ramo especial do Direito, mas não excepcional, e que, assim, a analogia é uma “estrada de mão dupla”, porque pode beneficiar o Fisco, como também o contribuinte (p. 434/435, obra mencionada).

                                      Perscrutemos, pois, acerca de qual princípio jurídico utilizou-se o Legislador ao criar a norma do artigo 130, parágrafo único, do Código Tributário nacional, e chegaremos à conclusão de que foram aqueles aspectos mencionados, que singularizam a arrematação em processo judicial (forma de aquisição originária e de expropriação legal de um bem), aqueles que justificaram a escolha do Legislador no determinar que, em havendo aquisição de um bem por meio de arrematação em processo judicial, que no valor do preço sejam sub-rogados os tributos até ali devidos. Sendo esse, pois, o princípio jurídico, pode-se aplicá-lo, por analogia, também a bens móveis, e não apenas a imóveis, de sorte que a regra do artigo 130, parágrafo único, do Código Tributário nacional é de ser aplicada, por analogia, ao IPVA.

                                      Destarte, tendo a autora adquirido o veículo descrito na peça inicial por meio de arrematação ocorrida em 2 de maio de 2016, não pode ser responsabilizada pelo pagamento do IPVA, cujo fato gerador tenha ocorrido em data anterior à data em que foi expedida a carta de arrematação, porque tais débitos sub-rogam-se no preço da arrematação, segundo o que prevê o artigo 130, parágrafo único, do Código Tributário nacional.

                                      POSTO ISSO, JULGO PROCEDENTE o pedido, declarando a inexistência de relação jurídico-tributária, para desobrigar a autora (…), de suportar a exigência do IPVA incidente sobre o veículo descrito a folha 2, que a autora adquiriu em hasta pública em 2 de maio de 2016, de modo que, quanto a fatos geradores do IPVA anteriores a essa data não pode a autora ser responsabilizada, já que tais débitos tributários sub-rogam-se no preço da arrematação. Ratifico, pois, a Decisão pela qual concedida nestes autos a tutela provisória de urgência cautelar. Declaro extinto este processo, com resolução do mérito, por aplicação subsidiária do artigo 487, inciso I, do novo Código de Processo Civil.

                                      Quanto a encargos de sucumbência, prevalece a regra do artigo 55 da Lei federal de número 9.099, de modo que, em não se tendo caracterizado a prática pela ré de ato de litigância de má-fé, não se lhe pode impor o pagamento de qualquer encargo dessa natureza, sequer honorários de advogado.

                                      Publique-se, registre-se e sejam as partes intimadas desta Sentença.

                                      São Paulo, em 4 de outubro de 2017.

                                      VALENTINO APARECIDO DE ANDRADE

                                               JUIZ DE DIREITO