CONTRATO DE LOCAÇÃO EM SHOPPING. ALEGAÇÃO DE ONERIDADE EXCESSIVA DESCARACTERIZADA EM RAZÃO DE MEDIDAS EQUITATIVAS IMPLEMENTADAS PELO LOCADOR E QUE MANTIVERAM O EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO DO CONTRATO. NEGADO O PEDIDO DE RESOLUÇÃO DO CONTRATO E RECONHECIDA A RESCISÃO DA AVENÇA POR VONTADE DA LOCATÁRIA

Processo número 1007221-86.2020
Juízo da 1ª. Vara Cível – Foro Regional de Pinheiros
Comarca da Capital

Vistos.

Objetiva a autora, (…), estabelecida nesta Capital, que se declare a resolução de contrato de locação, desobrigando-a de suportar o pagamento de alugueres a partir de 19 de março de 2020, além da multa prevista no contrato e de quaisquer outras penalidades, argumentando suportar uma onerosidade excessiva decorrente de efeitos gerados pela pandemia, que impedem a mantença de seu estabelecimento comercial instalado no imóvel objeto do contrato. Adotado o rito comum.

Citada, a ré contestou, afirmando que a autora, em 5 de agosto de 2020, procedeu à entrega das chaves, de modo que o contrato foi extinto a partir daquele momento. Sustenta a ré, outrossim, que a autora reconhece a validez da cláusula prevista no contrato, segundo a qual, em havendo rescisão por parte da autora, esta deve suportar multa correspondente ao valor de três alugueres. Aduz ainda ter concedido à autora a isenção dos alugueres vencidos em maio, junho e julho, além de descontos nos meses de abril e de agosto de 2020, para lenificar os prejuízos que a autora suportara em decorrência de medidas estatais impostas pela pandemia, afirmando que a autora deve-lhe a importância de R$139.083,29.

Réplica apresentada.

É o RELATÓRIO.

FUNDAMENTO.

Não há a necessidade de se produzirem outras provas além daquelas já apresentadas, de modo que o julgamento antecipado da lide é medida adequada, o que, de resto, as partes requereram.

Observe-se que, ao tempo em que ajuizou esta ação, em 14 de agosto de 2020, a autora já havia entregue as chaves do imóvel que lhe fora locado pela ré. Esse fato, contudo, não fez desaparecer o interesse de agir da autora quanto a pretender que se declare a resolução do contrato, porquanto subsiste para ser analisada a sua alegação de que experimentava, no curso da locação e como efeitos gerados pela pandemia, uma onerosidade excessiva. Daí a mantença do interesse de agir.

Quanto ao mérito da pretensão.

O Código Civil de 2002 prevê em seu artigo 478 a figura da “resolução por onerosidade excessiva”, que se aplica quando, em um contrato de execução continuada ou diferida, uma das partes contratantes esteja a suportar uma situação que possa se qualificar como “excessivamente onerosa”, uma cláusula geral que como toda cláusula geral deve ter seu conteúdo preenchido por valorações que são feitas de acordo com as circunstâncias do caso em concreto.

E são essas circunstâncias que conduzem a não se acolher a argumentação da autora. Com efeito, a ré demonstrou a folha 141 ter de sua parte significativamente minorado as obrigações impostas à autora por força do contrato de locação, reconhecendo que a mantença dos valores até então cobrados poderiam colocar a autora em uma situação de onerosidade excessiva. Para reduzir esse impacto, a ré, desde maio de 2020, concedeu à autora isenção no total no valor dos alugueres mensais, isenção que alcançou os alugueres vencidos em maio, junho e julho de 2020, período em que a autora não pudera manter seu estabelecimento comercial em funcionamento em razão de medidas estatais.

Além da isenção de alugueres, a ré ainda beneficiou a autora com uma isenção total da taxa de administração, além de reduzir em cinquenta por cento outros encargos previstos no contrato de locação. E para o mês de agosto daquele ano, a ré aceitou reduzir o valor do aluguel em 58%, justificando que a isenção não poderia ser mais integral porque a autora já podia reabrir seu estabelecimento comercial, segundo lhe autorizava o Poder Público municipal.

Diante desses aspectos fático-jurídicos, conclui-se que a ré, com as medidas que adotou, adequou o equilíbrio econômico-financeiro do contrato, beneficiando a autora com a isenção total/ou parcial de alugueres e encargos, o que infirma a alegação da autora de que estivesse ainda a suportar uma onerosidade excessiva, que foi eliminada pelas medidas que a ré adotou. Como estabelece o artigo 479 do Código Civil, quando o réu modifica equitativamente as condições do contrato, a resolução não é de ser decretada, tal como ocorre neste processo, em que a ré, antes mesmo de demandada judicialmente, engendrou e aplicou azadas medidas que, modificando importantes aspectos financeiros da contratação, permitiu que a autora tivesse sua posição no contrato harmonizada com a realidade circundante.

Pois bem, quando a autora decidiu por fim ao contrato, entregando as chaves do imóvel, já de há muito havia se beneficiado das medidas equitativas que a ré lhe concedera. Não pode a autora, portanto, beneficiar-se da alegação de que suportava efeitos de uma onerosidade excessiva, e por isso, tendo optado por rescindir o contrato, como efetivamente fez, deve suportar os encargos previstos no contrato para essa hipótese no contrato prevista, nomeadamente quanto à multa contratual por rescisão.

POSTO ISSO, JULGO IMPROCEDENTE o pedido, declarando este processo extinto, com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil.

Condeno a autora no reembolso à ré do que esta suportou a título de despesas processuais, com atualização monetária desde o respectivo desembolso. Condeno a autora também em honorários de advogado, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atribuído à causa, devidamente corrigido.

Publique-se, registre-se e sejam as partes intimadas desta Sentença.

São Paulo, em 20 de julho de 2021.

VALENTINO APARECIDO DE ANDRADE
JUIZ DE DIREITO