AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DIREITO DE INFORMAÇÃO. PRODUTO CUJA PROPAGANDA OMITIRIA EXISTIR EM SUA COMPOSIÇÃO DETERMINADO INGREDIENTE. VEGANISMO

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA AJUIZADA POR ASSOCIAÇÃO SEM FINS LUCRATIVOS E DE PROTEÇÃO A UM VEGETARIAMISMO ÉTICO, COMPREENDENDO A DEFESA DOS DIREITOS DOS ANIMAIS E DA SOCIEDADE CIVIL. ALEGAÇÃO DA AUTORA DE QUE A RÉ INSERIRA PROPAGANDA COM CONTEÚDO INVERÍDICO EM SEU PRODUTO (…), EM CUJA COMPOSIÇÃO HAVIA INGREDIENTE DE ORIGEM ANIMAL, O QUE FORA INTENCIONALMENTE OCULTO DO PÚBLICO CONSUMIDOR.
SENTENÇA QUE JULGOU IMPROCEDENTES OS PEDIDOS SOB O FUNDAMENTO DE INEXISTÊNCIA DE PROVA DE QUE A RÉ TIVESSE SE VALIDO DE PROPAGANDA ENGANOSA DIRECIONADA AO PÚBLICO EM GERAL, E QUE A RESPOSTA ENCAMINHADA PELA RÉ POR SEU SERVIÇO DE ASSISTÊNCIA AO CONSUMIDOR – SAC – ACERCA DA COMPOSIÇÃO DE SEU PRODUTO TINHA COMO DESTINATÁRIA UMA ÚNICA CONSUMIDORA, E QUE SE HÁ ESCUSAR A RÉ, SEGUNDO O JUÍZO DE ORIGEM, CONSIDERANDO QUE A INFORMAÇÃO NÃO PODIA SER PRESTADA IMEDIATAMENTE QUANTO A ASPECTOS QUE ENVOLVIAM SEGREDO INDUSTRIAL, E ESSENCIALMENTE TÉCNICOS.
APELO DA AUTORA EM QUE, PUGNANDO PELA REFORMA DA R. SENTENÇA, AFIRMA QUE SE FEZ PROVADO NOS AUTOS QUE A RÉ INSERIU INFORMAÇÃO INVERÍDICA NA PROPAGANDA DE SEUS PRODUTOS, ENFATIZANDO A AUTORA QUE NÃO SE TRATA DE CONTROVERTER ACERCA DE OMISSÃO DE INFORMAÇÃO, MAS SIM DE UMA INFORMAÇÃO INTENCIONALMENTE INVERÍDICA REALIZADA PELA RÉ, SENDO ESSA A CAUSA DE PEDIR DA AÇÃO.
APELO INSUBSISTENTE. INEXISTÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE QUE A RÉ TIVESSE SE UTILIZADO DE PROPAGANDA ENGANOSA QUANTO À COMPOSIÇÃO DE UM DE SEUS PRODUTOS COMO ESTRATAGEMA PARA CAPTAÇÃO DE CLIENTELA. INFORMAÇÃO IMPRECISA QUANTO À ESSA COMPOSIÇÃO QUE FORA VEICULADA A APENAS UMA CONSUMIDORA PELO CANAL DO SERVIÇO DE ATENDIMENTO AO CONSUMIDOR. INFORMAÇÃO QUE, VEICULADA POR ESSE CANAL DE COMUNICAÇÃO, É DE SER CARACTERIZADA COMO UMA INFORMAÇÃO NÃO TÉCNICA, OU QUE NÃO NECESSITA DE O SER.
RELAÇÃO DE CONSUMO QUE, FORMANDO A CAUSA DE PEDIR, PODERIA CONDUZIR À CARACTERIZAÇÃO DO REGIME DE RESPONSABILIDADE CIVIL COMO OBJETIVA, MAS NÃO PRESCINDINDO DE A AUTORA FAZER PROVA DO NEXO DE CAUSALIDADE, DO QUE ELA NÃO SE DESINCUMBIU.
SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DE APELAÇÃO DESPROVIDO. SEM ENCARGOS DE SUCUMBÊNCIA.

RELATÓRIO
Ação civil pública ajuizada por (…) contra (…), em que, apresentando um contexto de supostas práticas lesivas ao direito de informação de consumidores vegetarianos, segundo o qual a ré, mesmo depois de ter sido averiguada no âmbito de inquérito civil aforado pelo Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul, teria propagado informações inverídicas e obscuras acerca das origens da vitamina “D” e de emulsificante utilizados em seus produtos (…) (creme vegetal) e (…), o que teria induzido inúmeros consumidores ao consumo de produtos advindos da morte de animais, em contrariedade aos seus valores éticos de alimentação; pretende obter um provimento jurisdicional que lhe assegure a responsabilização civil da ré, mediante a condenação desta ao pagamento de indenização estimada em R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), à título de reparação por danos morais coletivos, a ser destinada a um fundo especial de divulgação e conscientização do vegetarianismo ou veganismo ou, subsidiariamente, ao Fundo de Defesa de Direitos Difusos, nos termos da Lei federal n.º 7.347/1985.
A r. sentença, contudo, assinalando, entre outros aspectos de relevo, que “(…) não há nenhuma prova de publicidade ou campanhas de marketing em que a ré tenha direcionado os produtos que são objeto da ação aos consumidores vegetarianos, em qualquer grupo do qual façam parte” e que “Se algum dano ocorreu, dirigiu-se exclusivamente aos consumidores que receberam, via SAC, a informação equivocada;” julgou improcedente o pedido (fls. 684/687).
Interpondo recurso de apelação, sustenta a associação-autora que incorreu em “error in judicando” ao desconsiderar ou não bem valorar: que a prática da ré não se trata da omissão da informação, mas sim de informação inverídica prestada acerca dos questionamentos dos consumidores, nomeadamente quanto à origem da vitamina “D” dos produtos, do ingrediente mono e glicerídeos de ácidos graxos, fator que, segundo afirma, prejudicou a liberdade de escolha de toda comunidade vegetariana; que essas informações não possuem um caráter técnico ou são confidenciais, pois que a ré chegou a divulgá-las seja através do SAC, seja através dos esclarecimentos prestados no âmbito do inquérito civil; que, a despeito de não ter sido praticada publicidade ostensiva sobre esses ingredientes, o dano moral coletivo decorre dos prejuízos que a informação equivocada transmitida pela ré no âmbito do grupo de consumidores vegetarianos. Destarte, pugna pela reforma da r. sentença, com o acolhimento da sua pretensão inicial (fls. 689/700).
Recurso tempestivo, isento de preparo (LACP, art. 18) e contra-arrazoado (fls. 705/733).
A douta Procuradoria de Justiça, obtemperando que “(…) restou evidenciado nos autos que a apelada não se utilizou de publicidade ou propaganda enganosa para divulgar seus produtos com informações falsas, tampouco direcionou a venda ao público adepto adietas veganas e vegetarianas. Ao que parece, ainda que tenha ocorrido um equívoco nas informações, não há conduta dolosa por parte da apelante, nem mesmo a ocorrência de dano moral coletivo;” manifestou-se pelo desprovimento deste recurso, conforme r. parecer de folhas 743/745.

FUNDAMENTAÇÃO
A despeito do que argumenta a autora em seu recurso de apelação, nomeadamente daquilo que forma, em essência, a causa de pedir desta ação civil pública, deve prevalecer a r. sentença.
Com efeito, conquanto sublinhe a autora que não está a controverter quanto a ter a ré se utilizado ou não de propaganda enganosa, senão que afirma que ela inseriu informação inverídica, associando-a ao produto denominado (…)”, em cuja composição estava um emulsificante de origem animal, considerando, pois, essa causa de pedir, ainda assim há que se manter a conclusão a que chegou o juízo de origem, em que cuidou observar que não havia na propaganda realizada pela ré acerca desse produto nenhuma informação que excluísse a possibilidade de que, na composição do produto em questão, houvesse um ingrediente de origem animal, de maneira que, inexistindo propaganda enganosa, não poderia a ré ser responsabilizada civilmente por dano coletivo.
Quanto ao fato de a ré ter, por meio de seu Serviço de Atendimento ao Consumidor – SAC, informado a uma única consumidora de que o produto “(…)” não tinha em sua composição nenhum ingrediente de origem animal, daí não decorre a conclusão defendida pela autora, pois que, além de se tratar de uma informação que, veiculada pelo “SAC”, não pode ser qualificada como uma informação técnica, ou seja, não se exige da empresa informe ao cliente aspectos que são do mundo da técnica, muitos dos quais protegidos por lei, há também por se considerar que se tratava de uma informação dirigida a apenas uma consumidora, de maneira que, ainda que imprecisa a informação prestada (e imprecisa não significa necessariamente “inverídica), essa informação, pois, não tinha nenhum potencial de atingir o universo dos consumidores do produto, ao contrário do que sustenta a autora, o que robustece a conclusão a que chegou o juízo de origem, quando destaca que:
“(…) o que se vê dos autos está longe de ser um atentado ao coletivo. Não houve publicidade ou propaganda enganosa e não houve campanha de marketing dirigida aos vegetarianos de qualquer dos grupos existentes; a informação enganosa que a autora alega ter havido foi uma resposta a indagação de pouquíssimos consumidores, feita individualmente no SAC, indagação que envolve questão de segredo industrial e também profundidade técnica cuja resposta não se espera de um atendimento do SAC. Não há prova nos autos de qualquer outra incongruência nas informações prestadas pela ré quanto a seus produtos”. (cf. folha 687).
Convém observar que, em se considerando como de consumo a relação jurídico-material objeto desta ação civil pública, poder-se-ia aplicar o regime de responsabilidade civil objetiva. Mas diante desse regime, há a necessidade de comprovação do nexo de causalidade, e dessa prova a autora não se desincumbiu.
Por meu voto, nega-se provimento ao recurso de apelação, mantida a r. sentença.
Aplicando o artigo 18 da Lei federal 7.347/1985, a “Lei da Ação Civil Pública”, reconhecendo-se à autora o ter exercido seu direito de ação dentro de justos limites, não se a condena em encargos de sucumbência, nem mesmo em honorários de advogado.
VALENTINO APARECIDO DE ANDRADE
RELATOR