Processo número 1019231-07.2018
3ª. Vara do Juizado Especial de Fazenda Pública
Comarca da Capital
Vistos.
Afirma a autora, (…), microempresa estabelecida nesta Capital, a ocorrência da prescrição intercorrente em ações de execução fiscal que lhe foram ajuizadas pela ré, FAZENDA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO, de modo que, reconhecida a prescrição intercorrente e com ela a extinção do respectivo débito tributário, garanta-se-lhe o direito a receber em restituição o que pagou por conta do tributo (ICMS).
Citada, a ré contestou, arguindo a inépcia da peça inicial, a ausência do interesse de agir, e quanto ao mérito da pretensão para argumentar que, suspenso o trâmite das ações de execução fiscal segundo o que autoriza o artigo 40 da Lei federal 6.830/1980, a prescrição intercorrente não se configura.
Nesse contexto, FUNDAMENTO e DECIDO.
Embora singela, a peça inicial não é inepta, porque é possível compreender qual a causa de pedir que a autora invoca, e a partir dela o pedido, que diz respeito a ocorrência de prescrição intercorrente em ações de execução fiscal que lhe foram ajuizadas quanto a débitos de ICMS, para a caracterização de suposto indébito tributário.
Quanto ao mérito da pretensão.
A rigor, a matéria relacionada à prescrição intercorrente deve ser alegada no mesmo processo em que ela terá ocorrido, dado que se trata de uma prescrição que ocorre no curso de um processo judicial. Mas em determinadas circunstâncias, e nomeadamente em função do que forma a causa de pedir, permite-se que a alegação de prescrição intercorrente ocorra noutra ação, quando, como neste caso, a alegação da prescrição intercorrente não diga respeito diretamente ao destino da ação de execução fiscal, mas a um outro direito material, o direito de restituição de um suposto indébito. É desse suposto direito, pois, que se utiliza a autora nesta demanda, em que afirma que, extinto o débito por força da prescrição intercorrente, não deveria ter pago o tributo, e como o fez, é-lhe de direito receber em restituição o que pagou por conta do tributo. Sendo essa a causa de pedir (que não poderia, por força da competência, ser examinada nos autos da ação de execução fiscal), caracteriza-se o interesse de agir.
Destarte, conhece-se, nesta demanda, da alegação da prescrição intercorrente, que, segundo a autora, teria ocorrido nas ações de execução fiscal que relacionou.
Para ripostar tal alegação, a ré sustenta que as ações de execução foram suspensas por aplicação do artigo 40 da lei federal 6.830/1980, de modo que, durante o prazo dessa suspensão, o lapso da prescrição no processo, a dizer, a prescrição intercorrente, não se configura.
A prescrição intercorrente, criada pela jurisprudência, constitui uma azada forma de proteção ao direito processual do demandado, cuja esfera jurídica não pode permanecer indefinida por acentuado tempo, de modo que a inércia do Poder Público (seja do Poder Judiciário no caso de processo judicial, seja da Administração no caso de processo administrativo) na movimentação e conclusão do processo pode e deve caracterizar a prescrição intercorrente. É imperioso, assim, que se caracterize um retardamento injustificado na movimentação de uma ação processual e que esse retardamento possa ser atribuído exclusivamente ao autor da ação, e não à máquina judicial.
No caso das ações de execução fiscal a que a autora refere-se, demonstrou a ré que todas elas tiveram seu trâmite suspenso por aplicação do artigo 40 da lei federal 6.830/1980, que é o dispositivo que prevê a suspensão no caso em que não se encontrem bens do devedor que possam garantir o juízo, o que permite ao credor requerer a suspensão da ação de execução fiscal, na aguarda de que surjam esses bens.
Assim, não se configura tenha havido desinteresse do Fisco do Estado de São Paulo em manter como válido e regular o processamento das ações de execução fiscal que ajuizara contra a autora, senão que a providência que requereu e que obteve – a suspensão do trâmite das ações – demonstra que estava a movimentar tais ações dentro de seus direitos processuais.
“At last but not least”: conquanto se tenha feito observar que a autora poderia ter, noutra ação, alegado a prescrição intercorrente, e não necessariamente nos autos da ação de execução fiscal, isso não significa que não se deva levar em conta que o fato de a autora não ter alegado, em exceção de pré-executividade, a prescrição intercorrente, indica que as ações estavam com seu trâmite regular, tanto assim que a ré nada alegara em contrário.
POSTO ISSO, JULGO IMPROCEDENTE o pedido, declarando a extinção deste processo, com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do novo Código de Processo Civil.
Quanto a encargos de sucumbência, prevalece a regra do artigo 55 da Lei federal de número 9.099, de modo que, em não se tendo caracterizado a prática pela autora de ato de litigância de má-fé, não se lhe pode impor o pagamento de qualquer encargo dessa natureza, sequer honorários de advogado.
Publique-se, registre-se e sejam as partes intimadas desta Sentença.
São Paulo, em 29 de julho de 2020.
VALENTINO APARECIDO DE ANDRADE
JUIZ DE DIREITO